Vereadores da próxima legislatura podem ganhar um salário mínimo

Matheus Augusto

Quem for eleito vereador neste ano, caso as eleições ocorram, pode ganhar em 12 meses o equivalente ao que os membros da atual legislatura ganham em um mês. O projeto protocolado na terça-feira, 14, pela Mesa Diretora da Câmara fixa o subsídio da função função em um salário mínimo (atualmente em R$ 1.045). A remuneração bruta em vigor é de R$ 12.177,65. 

A medida tem validade apenas para a próxima legislatura, que vai de 1º de janeiro de 2021 até 31 de dezembro de 2024.

Projeto

O texto garante a revisão anual dos valores no mês de março, conforme o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Em caso de ausência não-justificada, será descontado 1/30 por reunião do pagamento.

Além disso, o 13° salário corresponderá por 1/12 por mês de efetivo exercício.

Necessidade

Para justificar a atitude, o presidente da Câmara, Rodrigo Kaboja (PSD), cita que os recursos economizados podem ser utilizados na Infraestrutura, Saúde e Educação, além de auxiliar a Prefeitura a lidar com as consequências dos impactos econômicos causados pelo novo coronavírus (covid-19).

— Inicialmente, debatemos uma proposta que estabeleceria zerar os subsídios dos vereadores. No entanto, após análise do jurídico da Câmara, obtivemos a informação de que ela teria caráter inconstitucional.  Diante disso, a Mesa Diretora chegou ao consenso de que o novo subsídio deveria ser estabelecido no mesmo patamar do atual salário mínimo. Somadas às medidas de cortes e contenção de despesas que já estamos adotando, esse projeto, que é fruto de debate entre vários vereadores e a Mesa Diretora, também prepara nossa cidade para o futuro, para as medidas que iremos ter que adotar após a pandemia do novo coronavírus — detalhou.  

Conforme informou a Câmara em nota, a Procuradoria da Casa entendeu como inconstitucional a possibilidade de zerar o salário, pela “não caracterização da função parlamentar de vereador como atividade voluntária, violação à disposição da Declaração Universal dos Direitos do Homem e também pela decorrência da caracterização da vereança como atividade remunerada”. Ainda de acordo com o setor, esse tipo de alteração só pode ser proposta pela Mesa Diretora.

A assessoria de comunicação do Legislativo também esclareceu que, com base na Constituição Federal, as legislaturas não podem votar projetos de subsídios em benefício próprio, independente de tratar do aumento ou da redução dos salários. Assim, uma vez aprovado, a próxima legislatura pode votar pelo acréscimo do valor, no entanto a mudança entrará em vigor apenas em 2025.

Votação

O projeto está previsto para ser lido na reunião extraordinária convocada para hoje e, assim, fica disponível para votação no próximo encontro entre os vereadores, ainda não convocada oficialmente. Para ser aprovado, o projeto precisa receber a maioria simples dos votos. O presidente da Câmara votará apenas em caso da necessidade de desempate. 

Pelas redes sociais, o vereador Matheus Costa (CDN), por exemplo, anunciou a apresentação de uma emenda para que a redução salarial também seja aplicada ao prefeito, ao vice e aos secretários. Conforme determina o trâmite, todas as emendas devem ser votadas separadas do projeto.

Também nas redes sociais, muita gente se manifestou, a favor e contra. Alguns afirmam que pode servir até de exemplo para outros municípios. Mas a maioria nomeia a ação de politiqueira em ano eleitoral. No entanto, o Agora também ouviu um especialista no assunto. 

Viável

Sobre o projeto, a reportagem conversou com o conselheiro estadual da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em Divinópolis, o especialista em direito eleitoral e advogado militante Alican Albernaz de Oliveira. Segundo ele, mesmo se tratando de ano eleitoral, a proposta pode ser colocada em votação, visto que só terá validade para a próxima legislatura.

— ​Quanto à redução dos subsídios, entendo como perfeitamente constitucional, pois o eventual ato normativo nesse rumo não viola o princípio da irredutibilidade dos vencimentos previstos na Constituição Estadual. Esta irredutibilidade dos vencimentos é aplicável exclusivamente aos servidores públicos, ocupantes de cargos ou empregos públicos, não incidindo em relação aos vereadores, agentes políticos sem vínculo profissional com a Administração, cujos subsídios devem ser fixados por lei específica para cada legislatura, respeitado o princípio da anterioridade. Tal regra, aliás, guarda sintonia com a Constituição Federal, na medida em que se funda nos princípios da moralidade e da impessoalidade, objetivando que a fixação dos subsídios do Poder Legislativo ocorra antes do conhecimento dos resultados eleitorais e assunção dos novos edis, a fim de obstaculizar que eventualmente legislem em seu próprio favor — explicou.

Segundo o especialista, a legislação apenas limita o máximo que os vereadores podem receber. 

— (...) Entendo ainda que a redução dos subsídios dos vereadores não mostra-se em descompasso com os princípios da razoabilidade, da legalidade, da moralidade e da impessoalidade, previstos na Constituição Federal, pois a Carta prevê limites máximos para a fixação dos subsídios dos vereadores, proporcionais à remuneração dos deputados estaduais, nada tratando a respeito do limite mínimo, razão pela qual não se mostra inconstitucional a redução a ser operada numa eventual legislação municipal — afirmou.

O advogado ainda disse que a própria atitude de zerar os salários é passível de discussão.

— Existe uma corrente que entende que a extinção do subsídio de vereadores é inconstitucional, eu particularmente entendo que não. O vereador é o único agente público que pode acumular funções/cargos e eles, nesta qualidade, não têm vínculo profissional com a Administração pública. Portanto, entendo que é constitucional a sua extinção, desde que não haja no projeto vício formal, como a usurpação da iniciativa privativa da Mesa Diretora da Câmara Municipal para deflagrar processo legislativo para extinção do subsídio dos vereadores.

Questionado se a prática não poderia incentivar as chamada “rachadinhas”, visto que os salários dos assessores não se alteraria, o advogado disse que não cabe a ele fazer o julgamento dos futuros vereadores.

Mais medidas

Pouco mais de um mês após Divinópolis registrar o primeiro caso confirmado de coronavírus, a Câmara anunciou novas medidas para contribuir financeiramente para a crise enfrentada pelo município. No mesmo dia em que a Prefeitura decretou estado de calamidade pública, o presidente Rodrigo Kaboja (PSD) determinou uma série de cortes no Legislativo, acatando, inclusive, recomendações da Justiça. 

— De imediato, teremos a extinção de cargos comissionados, conforme a Justiça já havia determinado em uma recente decisão; o corte de lanches e bebidas para os vereadores, a suspensão de contratos de prestação de serviço, como é o caso da transmissão via TV das reuniões, verba de publicidade, bem como da manutenção do painel eletrônico. Internamente, continuamos estudando novas medidas administrativas visando à redução dos gastos — acrescentou.

De acordo com Kaboja, diante da crise econômica causada pela covid-19, a Casa precisa contribuir e reduzir as despesas. 

— É um momento de cautela e precisamos mostrar ainda mais austeridade. Tivemos uma redução significativa das contas de água, energia elétrica, dentre outras despesas internas nesse período de suspensão das atividades, bem como com as férias coletivas, onde os funcionários e servidores, sem nenhum custo adicional, ficaram em suas casas, parte em regime home office, e usufruíram dos seus direitos. Mas, após conversas com os departamentos da Câmara, Mesa Diretora e com os parlamentares, seja por meio de pedidos e demandas sociais, avaliamos e estamos fazendo a nossa parte enquanto representantes eleitos — afirmou. 

O chefe do Poder Legislativo ainda ressaltou que novos cortes podem ser aplicados ao longo do ano.

— Ainda estou conversando com os vereadores, mas outra mudança proposta é a redução das verbas de gabinete, como material de expediente, telefone, correios e diárias para viagens, e também a questão do salário dos parlamentares para a próxima legislatura, uma vez que para a atual a lei não nos permite nenhuma alteração. Essa, inclusive, tem sido uma medida bastante debatida e eu tenho acompanhado. Mas sem nenhum tipo de populismo e demagogia, vamos conversar, dialogar e dar a nossa contribuição nesse momento onde todos estão sendo chamados a se unir e dar sua contribuição — finalizou. 

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