UPA: crises vão e voltam

Em um ano, situação da unidade mudou e melhorou, mas agora é alvo de investigação da Polícia Federal

Da Redação

Se 2020 foi dominado por eleição e coronavírus, em 2019, um dos temas dominante foi a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Padre Roberto. A estrutura vivia um ano de incertezas, dado o fim do contrato com a Santa Casa de Formiga, ex-administradora. Para contornar o problema, a Prefeitura elaborou uma licitação para convocar entidades interessadas em assumir a unidade. Agora, o processo é investigado por indícios de irregularidades na escolha e posterior administração da Organização Social (OS). 

Críticas desde o início

Alvo constante de críticas, o Executivo anunciou com antecedência que não renovaria o contrato com a Santa Casa. Em novembro de 2018, os prefeitos membros do CIS-URG rejeitaram, por uma diferença de um voto, que o consórcio entre os municípios, que administra o Samu, fosse resposável pela gestão da UPA.

Desde sua inauguração, em 2014, a administração da unidade era feita pela Santa Casa de Formiga. Três anos depois, em dezembro de 2017, a Câmara instaurou uma CPI para investigar supostas irregularidades no contrato de gestão. O pedido foi feito pela vereadora Janete Aparecida (PSC) e, além dela, Zé Luiz da Farmácia (PMN), Nego do Buriti (PSB) e Raimundo Nonato (Avante) formaram a comissão. 

Em outubro daquele ano, o relatório final era apresentado, sinalizando um pagamento irregular de cerca de R$ 2,7 milhões à administração. Diante da situação e das críticas de superlotação e demora de atendimento, o contrato não seria renovado.

Ministério Público

Enquanto a Santa Casa continuava a manter a UPA, a Prefeitura se articulava para definir os responsáveis pela próxima gestão. Em 7 de julho de 2019, o secretário de Saúde hoje afastado do cargo em razão das investigações , Amarildo Sousa, se reuniu com vereadores para discutir a situação. Na época, o Ministério Público (MP) recomendou readequações na estrutura de pronto-atendimento. O Ministério da Saúde também havia indicado à secretaria investimentos realizados de forma errada, "pois a UPA está fazendo atendimentos que não deveriam ser incumbência sua, e isso prejudica a gestão”.

— Diante desse cenário, nossa única saída possível é a licitação de uma Organização Social — comunicou o secretário.

A Prefeitura afirmou que a unidade tinha uma equipe maior de especialistas do que o exigido em portaria. O custo médio de UPA no Brasil era de R$ 1,6 milhão, enquanto o gasto mensal da unidade era de R$ 2,3 milhões.

Ao fim do encontro, os presentes acordaram de que era necessária a transição para a nova gestora da UPA Padre Roberto. Participaram da reunião os vereadores Edsom Sousa (CDN), Josafá Anderson (CDN), José Luiz da Farmácia (PMN), Dr. Delano Santiago (MDB), Renato Ferreira (PSDB) e Janete Aparecida (PSC), conforme informações da Câmara.

Começa o processo

Para atender às recomendações dos órgãos, o processo licitatório teve início, promovendo, em seu edital, uma série de alterações no formato de funcionamento da UPA. Onze empresas participaram do processo inicial de licitação, oito foram qualificadas e apenas cinco apresentaram a documentação necessária e chegaram à fase final.

— A portaria do Ministério da Saúde tem muitas especificidades, inclusive para tempo de gestão em área de urgência e emergência. Como não houve candidatos locais, pensamos que ainda não há empresa divinopolitana apta a assumir a gestão da UPA. Acreditamos que a situação possa mudar futuramente — explicou  a diretora de Atendimento de Urgência e Emergência, Cristiane Silva Joaquim, à época.

Para fins de transparência, a Semusa ressaltou não manter contato direto com nenhuma das entidades.

Os envelopes com as propostas foram abertos no dia 30 mas o processo não terminaria ali. “O Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS), de Belo Horizonte, venceu o processo por apresentar o valor de R$ 91.043.671,20 para 60 meses de serviço”, informou a Prefeitura horas depois.

— O gerenciamento e a administração da UPA custarão R$ 1.517.394,92 por mês. A proposta foi a que teve menor preço dentro da estimativa da Administração e é compatível com o praticado no mercado — justificou.

Outras quatro empresas disputaram a gestão: o Instituto Brasileiro de Políticas Públicas, com sede no Maranhão, tinha proposta de R$ 91.691.488,89. Já a proposta do Instituto Nacional de Pesquisa e Gestão em Saúde, com sede em Pompeia e Bernardino dos Campos, em São Paulo, foi de R$ 101.965.020,00. O Hospital Maternidade Therezinha de Jesus, de Juiz de Fora, por sua vez, apresentou uma proposta de R$ 104.421.863,69; e a Organização Social João Marchesi, de Penápolis, São Paulo, R$ 111.394.500,00.

Irregularidades

No início de agosto, porém, as instituições Hospital Maternidade Therezinha de Jesus (HMTJ) e Instituto Nacional de Pesquisa e Gestão de Saúde (Insaúde) apresentaram recurso referente ao resultado do julgamento das propostas. Segundo elas, o IBDS, por exemplo, apresentou soma irregular de valores, não respeitou o edital ao propor a contratação de médicos como pessoa jurídica e não CLT, como era previsto e relatou um orçamento incompatível com o necessário para lidar com a demanda da UPA, além de outras pontos de confronto com as obrigações do edital. 

Diante dos argumentos, por ofensa ao Princípio de Vinculação ao Edital, a IBDS deveria ser desclassificada.

Segue

No dia 22 de agosto, após os recursos serem rejeitados, o IBDS era homologado como o vencedor definitivo do processo. Na semana seguinte, representantes do instituto anunciaram que precisariam entre 45 a 60 para iniciar a transição e assumir a UPA. Finalmente, cumpridos todos os trâmites, o instituto assumiu, em 30 de setembro, a UPA.

— O IBDS cumpriu todas as etapas e todos os requisitos. É uma empresa que já tem uma expertise em administração de UPA. Ela já iniciou os trabalhos e nós estamos confiantes de que vamos ter uma administração moderna, mais experiente e, com certeza, vai ser um ganho para a população de Divinópolis — afirmou, na época, o secretário de Saúde.

Em seguida, o assessor técnico do IBDS, Paulo Henrique Silva, falou sobre o histórico da entidade.

— Nós somos uma entidade que não tem fins lucrativos. Estamos no mercado desde 2002. O instituto nasceu com o propósito de apoiar a gestão em Saúde e tem desenvolvido seu propósito desde sua fundação. Através disso, nós já participamos de vários projetos junto aos Municípios, ao Estado e à União — citou.

Semanas depois, em outubro, a Câmara anunciou a Comissão de Acompanhamento de Execução Assistencial, responsável por analisar se o contrato firmado com o IBDS – e seus aditivos – obedeciam aos preceitos legais. Outra responsabilidade dos membros era analisar, mensalmente, os parâmetros assistenciais. “O objetivo da comissão é comunicar ao secretário, à Controladoria Geral e ao Ministério Público (MP) qualquer irregularidade ou ilegalidade encontrada referente aos recursos ou bens de origem pública do IBDS”, pontuou o Legislativo.

Na Câmara…

os elogios. No primeiro balanço parcial divulgado pela IBDS, sobre os 45 dias iniciais da gestão, vereadores levaram os indicadores ao Plenário e destacaram o início positivo da nova empresa. Além de Eduardo Print Jr (MDB), abordou o tema a vice-prefeita eleita, Janete Aparecida (PSC).

— Continuarei acompanhando e, se em algum momento piorar, pode ter certeza que eu vou trazer os números aqui. Mas só vai melhorar se a gente tiver uma fiscalização assídua, e os trabalhos têm que funcionar nos Programas Saúde da Família (PSFs) e nas unidades de saúde. E, apenas assim, vamos conseguir fazer esse serviço em rede com eficiência — finalizou.

Em outro vídeo, que voltou a circular nas redes sociais, Janete diz enxergar com bons olhos a nova administração, apesar da pouca experiência. Ela ainda reforçou seu compromisso em fiscalizar a gestão.

Defesa

O fato de o processo ser acompanhado de perto por alguns vereadores, Ministério Público e servidores, além de ser conduzido pela Comissão de Licitação, é um dos argumentos de defesa do secretário afastado.

— Ressalta-se que, até o presente momento, não há qualquer prova de que Amarildo de Sousa tenha tido participação no suposto desvio de dinheiro. O investigado foi inquirido acerca da contratação da Organização Social IBDS, pois, segundo a Polícia Federal, esta empresa não preencheu os requisitos para que pudesse participar do processo licitatório. Ocorre que, segundo Amarildo, inicialmente, a referida empresa de fato não preencheu os requisitos legais na fase de qualificação, contudo, foi apresentado recurso e, por meio de decisão colegiada, foi deferida a participação na IBDS no processo licitatório — afirmou, em nota, o advogado de defesa, Leonardo Henrique.

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