Um ser iluminado

Flávio Flora 

É como se o anjo Rafael tivesse passado por Divinópolis entre os anos de 1942 e 1989 para fazer aquilo que soube fazer de melhor: curar enfermos e tratar agravos comuns, aliviando dor e sofrimento onde surgiam. 

Era o médico-cirurgião Sebastião Gomes Guimarães (1917-1989) um ser iluminado que cultivava a essência universal da verdade, compaixão e tolerância junto às pessoas comuns. Dispunha de uma espécie de terceira visão, da capacidade de ver com a “luz da natureza” e de estar sempre pronto nos momentos e locais a que era solicitado. 

Até prefeito municipal foi, por três vezes. Por muitos anos exerceu forte influência na política local voltada ao saneamento básico, à integração rural e às causas sociais. Sua vida política está bem detalhada na obra “Bão é o Bastião”, da escritora Anamaria Mourão. Era um pacificador, dedicado profissional e honesto administrador público que não misturava medicina com política, apesar de as duas áreas se beneficiarem de sua atuação. 

Muitas pessoas na região guardam recordações emocionantes de sua passagem, de curas milagrosas, de aconselhamentos que mudaram rumos de vidas, de sua atenção igual para com pobres e ricos, adversários ou não, de sua voluntariedade com os desamparados e de seu jeito discreto de viver. 

Fazia longos plantões quando algum caso grave estava sob seus cuidados; jamais negou atendimento e quando alguém morria, ele se culpava por não ter vencido a enfermidade. Ficava deprimido com esse pesar. 

Características interessantes do doutor Sebastião também estão muito bem descritas na obra organizada pelo ex-vereador Mauro Corgozinho Raposo (“Dr. Sebastião, o médico do povo”, 2007). Os relatos de testemunhas de vida revelam um homem santo, despojado de ambição material e desapegado do poder.  

Uma marca registrada de sua presença era aquele assobio melodioso – um suspiro significativo de felicidade, alento ou esperança, quando chegava ou saía otimista de uma visita, estava prestes a emitir um diagnóstico ou se preparava para uma cirurgia. 

Três cenas são suficientes para ilustrar a biografia do doutor Sebastião: uma em que ele, alta noite de inverno, atende a um pedinte doente e lhe dá seu cobertor e um remédio e volta a dormir apenas com o lençol na fria madrugada (registrada pelos sobrinhos Clarissa e Juarez Carneiro). Outra, destacada por frei Bernardino Leers OFM, ocorreu na enfermaria da Santa Casa, com alguns pacientes agrupados em um canto da sala “ao redor de alguém. Prosa, gargalhada, ambiente de leveza. Sentado na cama de um doente estava um homem de jaleco branco”. E outra, descrita pelo padre Miguel: “Quando consultava alguém, tamborilava como a pedir aos anjos que o ajudassem. Era o momento mais profundo de sua vida. Era todo ouvidos. Sua bondade vinha à tona. Ele se inclinava diante do simples e do enfermo. Gostava de estar com eles”. 

Nas comemorações de seu centenário de nascimento, muitas vozes se levantam para enaltecer sua memória, que resplandecerá para sempre no coração dos divinopolitanos.  Salve 16 de setembro! 

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