Tem tanta coisa

A Netflix lançou, no dia 3 deste mês, o especial de Natal do Porta dos Fundos: “A Primeira Tentação de Cristo”. Mas a produção parece não ter agradado muita gente. O especial incomodou a ponto de alguns religiosos fazerem um abaixo-assinado, que já tem um milhão de assinaturas, pedindo a retirada da produção. Se fosse até aí, tudo bem, afinal, o brasileiro vive na hipocrisia, então vamos fingir que tudo bem. Porém, a situação foi um pouco além e chegou ao Poder Legislativo. O deputado federal Julio Cesar Ribeiro (Republicano) apresentou um requerimento na Câmara dos Deputados para que a Netflix se pronuncie sobre o especial de Natal. Sim! A coisa no Brasil anda muito estranha, muito feia. Com tantos problemas que o país tem, como violência, preço da carne nas alturas, aumentos consecutivos da gasolina, reajuste do salário-mínimo sem aumento real, e outros milhares de problemas, o parlamentar está preocupado com a Netflix.

Engana-se quem acha que a situação ficou apenas em Brasília. Ela chegou também a Divinópolis. Em seu discurso na reunião ordinária de ontem, 12, o vereador Sargento Elton (Patriota) se manifestou contra o especial de Natal. Em sua fala, o vereador disse: “Estamos na corrente que pede o cancelamento da assinatura da plataforma após a publicação desde filmezinho”. Pois é, como se Divinópolis também não tivesse problemas suficientes para ocupar o tempo e a mente dos vereadores. Mas, diante tamanha polêmica, e opiniões (algumas carregadas de paixão), o posicionamento da empresa diante deste movimento contrário à produção, nos faz refletir sobre aquilo que se estivesse sendo feito há muito tempo, que é “cada um cuida da sua vida”, talvez o Brasil estivesse mais evoluído.

Em nota, a Netflix afirmou que “valoriza e aprova a liberdade criativa dos artistas com quem trabalha, e reconhece também que nem todas as pessoas vão gostar deste conteúdo. Daí a liberdade de escolha oferecida pela empresa, em seu cardápio variado de opções, que inclui, por exemplo, novelas bíblicas”, ou seja, assiste quem quer. E, talvez, se os nobres parlamentares estivessem ocupados com os reais problemas de suas cidades e também do Brasil, o país poderia ter menos problemas e ter evoluído nem um pouquinho que seja. Afinal, problemas não faltam por aqui, o que está faltando mesmo é gente para resolvê-los. Pois, tal postura dos parlamentares demonstra que estamos carentes (mas muito carentes) de representatividade. Este espaço não defende a forma de como o especial foi feito, muito menos o seu conteúdo, isso fica para cada um. Que fique bem claro, que este JA, desde sempre defende o trabalho, a luta e o bem em prol desta sociedade tão sofrida e carente de benefícios básicos. Defende ainda que quem as representa não perca tempo com situações que não são da sua alçada.

É importante ressaltar que o assunto esbarra também na hipocrisia. A indignação é seletiva e não deve ser assim. Porém, não é normal para o Brasil. Nos indignamos apenas quando fere a nossa fé, quando o buraco é na nossa rua, quando estamos esperando na fila do Sistema Único de Saúde (SUS). O senso de respeito e coletividade está morto e enterrado. Defendemos apenas o que nos interessa. E o que nos interessa, com certeza, são outros problemas, não apenas um especial de fim de ano.  

Comentários