Setembro Amarelo: como a depressão é retratada no cinema

Maria Tereza Oliveira 

Neste mês é realizada a campanha de conscientização e prevenção ao suicídio Setembro Amarelo. O tema desde sempre é tabu na sociedade e a abordagem exige parcimônia e sensibilidade. O mesmo deve ocorrer em produções audiovisuais, mas nem sempre é o que acontece. A depressão e até o autoextermínio são abordados em obras do cinema e da TV, mas isso seria uma boa escolha?

Nos últimos anos, uma série adolescente cujo nome não vou citar teve bastante repercussão por tratar do assunto. No entanto, enquanto as opiniões do público se dividiram, a maior parte dos profissionais da psicologia teve opiniões negativas. Assim como o jornalismo precisa ter uma série de cuidados para tratar o assunto, a ficção também precisa ter responsabilidade para acrescentar esse elemento nas histórias.

Desserviço

Para a psicóloga Cecília Martins, 32, a série em questão, em sua primeira temporada, tem inúmeras falhas, como a romantização do autoextermínio, usar a situação como "forma de vingança" e, principalmente, mostrar cenas inadequadas, sobretudo para alguém que possa se identificar com a personagem, de forma gráfica.

— A protagonista é uma pessoa que sofre com a depressão, mas às vezes a série não a trata como tal. Parece que ela passou por situações extremas e usa a atitude final como forma de vingança. Quando, na verdade, as situações que lhe ocorreram são gatilhos para algo que já estava nela — aponta.

De acordo com a profissional, a forma com que a obra encaminha a situação e aborda o tema pode incentivar pessoas que estão com pensamentos suicidas.

— A série até passa uma mensagem para que as pessoas busquem ajuda psicológica, mas, no fim, o discurso é raso e desvalorizado pela própria produção na segunda temporada. Isso, além de insensível, é antiético — opinou.

De fato, após a série estrear, o Centro de Valorização da Vida (CVV) chegou a divulgar que as ligações e e-mails de pessoas pedindo ajuda aumentaram 445%. Na época, o centro chegou a informar que a maioria dos pedidos de socorro era de jovens dizendo que se identificavam com a protagonista.

— Apesar dos pesares e da irresponsabilidade, o primeiro ano da série teve esse ponto positivo. Parecia se tratar de uma obra com boa intenção, mas sem responsabilidade. Porém, quando ela foi renovada, isso caiu por terra — comparou.

Para Cecília, a série "se vendeu" e ignorou todas as críticas para a segunda temporada. A psicóloga alerta para a lição errada e perigosa que é deixada ao finalizar o arco da protagonista.

— Após a finalização da série como um todo, é seguro dizer que a obra é um desserviço, não só quando aborda temas relacionados à depressão, como também estimula o jeito absolutamente inadequado e irresponsável de lidar com pessoas e situações. Mais do que irresponsável, essa série é perigosa — alertou.

Como falar?

A 7ª Arte, mesmo as obras ficcionais e fantasiosas, tem mensagens e reflete a sociedade. Assim como na vida real, ignorar a existência de algo não o faz desaparecer. Falar sobre a prevenção e conscientização da depressão e suicídio também pode ser uma das pautas do cinema, desde que bem abordada. A principal preocupação, assim como no jornalismo, é para que a inclusão deste tema não tenha o efeito imitativo para o público.

No ano passado a Organização Mundial da Saúde (OMS) chegou a pedir que os diretores usassem uma "imagem diferente” do suicídio em suas obras. A ideia é que as produções não dessem detalhes sobre o método usado para o autoextermínio, justamente para evitar o efeito imitador.

Assim como no jornalismo, o ponto ideal dos filmes com essa temática é levantar o assunto para reflexão social. Alguns que cumprem esse papel de forma responsável são "Orações para Bobby" (2009); "Garota Interrompida" (1999); "As Virgens Suicidas" (1999),  "O lado bom da vida" (2012); "Últimos Dias" (2005); o documentário "Not Alone" (2017), que aborda a depressão na adolescência; "Elena" (2012), outro documentário, desta vez nacional, que trata da busca da documentarista Petra Costa por sua irmã; além de "Divertida Mente" (2015), filme sensível e infantil.

 

Essa coluna escrita com orientação da psicológa Cecília Martins

 

Maria Tereza é jornalista e apaixonada por cinema

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