Quadro negro

Inocêncio Nóbrega

O Brasil soma-se a nações do continente de curtas estabilidades políticas. O desenvolvimento econômico e social são coisas de quimera, prejudicados pelos interesses internacionais. Permutam sua própria dignidade. E não são poucos os exemplos que o passado nos fornece. As repúblicas são recheadas de ditaduras e governos fantoches, postos por golpes e sucessivas quarteladas. As democracias, incipientes, nascem, porém não alcançam a maturidade. As constituições sofrem constantes situações de causa e efeito. Os elementos institucionais se digladiam, raros os casos de unidade perfeita e harmônica.

Vivenciamos, hoje, a excrescência de um de seus poderes, obrigando aos demais buscarem a defesa dentro do estado de direito. Quando não ofendidos por blocos conspiradores, o faz contra si um preposto, que o induta. Essa a tarefa exercida por Daniel Silveira, exortando pela morte nosso tênue regime democrático, provocando a competente intervenção do Legislativo e Judiciário.

Esse último episódio pode ter uma narrativa próxima à estreia do Primeiro Império. As declarações, anteriores, de Pedro I, iam no sentido de um comportamento liberal, compartilhadas na campanha pela independência, através da força e vontade dos brasileiros. A incompetência administrativa do monarca, para organizar e gerir a grande comunidade sul-americana que nascia, era compensada pela cultura e fibra de José Bonifácio. Logo sobreveio o desvio de conduta do mandatário, que pulou para o autoritarismo. A Assembleia Constituinte foi por ele dissolvida, pois preconizava, em um de seus mais de 200 artigos discutidos, a limitação e controle dos arroubos palacianos. O Patriarca, irmão do indômito deputado Antônio Carlos, é destituído. O Gabinete do Ódio, da época, é instalado, somente desfeito em 1831, com a imprensa e o povo nas ruas exigindo sua abdicação.

Noutra fase da história, Márcio Moreira Alves, jornalista e parlamentar, assume a tribuna para protestar contra a invasão, por policiais, à UnB. Dizendo-se indignado com a atitude policialesca, sugere o boicote ao desfile de 7 de Setembro, de 1968, e que as moças evitem namorar militares. O Executivo pede sua cassação, mas a Câmara rejeita. O AI-5 é editado em dezembro, o autoritarismo é reforçado, surgem os “anos de chumbo”, os brasileiros, se ficam na sua Pátria, correm o risco de prisão e morte; muitos preferem o exílio, como fizeram os Andrada e outros compatriotas de então. Nova Constituinte e bandeiras de liberdade são pregadas. A imposição estrelar e mandonista decai. Vencemos. Não consintamos que o quadro negro da história se repita. A democracia e a Constituição hão de prevalecer. Dentro da ordem ou pelo grito das passeatas.

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