Pobre consome tudo!

“Rico capitaliza recursos, pobre consome tudo.” A constatação é de Paulo Guedes, ministro da Economia do governo Bolsonaro. Está explicado por que os ricos estão cada vez mais ricos e os pobres continuam pobres e cada vez mais. Conforme a ideologia da meritocracia, é mérito dos ricos e demérito dos pobres. 

No Brasil, quase 104 milhões de pessoas vivem com R$ 413 por mês. Enquanto apenas seis brasileiros detêm riqueza igual à desses 104 milhões. Mas por que aquelas multidões dos R$ 413 não economizam uma parte, para investir em fundos ou na Bolsa de Valores, ou pelo menos depositar na poupança? Tornar-se-iam ricos também. Mas são gastadores, consumistas imprevidentes. Dos R$ 413 consomem tudo! Fazem por merecer a miséria em que vivem e estamos conversados.

Na contramão desse raciocínio cínico, em 2016, no encerramento do Jubileu da Misericórdia, o papa Francisco instituiu o “Dia Mundial dos Pobres”, a ser celebrado no penúltimo domingo do ano litúrgico. Portanto, no próximo domingo. Esta semana que corre seria uma jornada de oração e reflexão sobre as questões ligadas ao crescimento da miséria e da concentração da riqueza em todo o mundo.

Para esta terceira jornada, Francisco buscou no Livro dos Salmos (9,19) a iluminação bíblica: “A esperança dos pobres jamais se frustrará”. Alguma semelhança pode-se ver com o refrão que costuma ser cantado em coro, nas manifestações e protestos: “O povo unido jamais será vencido”. Diz o pontífice, na sua mensagem: “No período da redação do salmo, assistia-se a um grande desenvolvimento econômico, que também acabou, como acontece frequentemente, por gerar fortes desequilíbrios sociais. A realidade hoje não é muito diferente! Há numerosos grupos de pessoas aos quais a crise econômica não impediu um enriquecimento, tanto mais anômalo quanto aquele confrontado com o imenso número de pobres que vemos pelas nossas estradas. (...) Como esquecer os milhões de migrantes, vítimas de tantos interesses ocultos, a quem se negam a solidariedade e a igualdade? E todas as pessoas sem abrigo e marginalizadas, que vagueiam pelas ruas das nossas cidades? (...) Aos discípulos do Senhor Jesus, a condição que se lhes impõe, para que sejam evangelizadores coerentes, é semear sinais palpáveis de esperança. A todas as comunidades cristãs e aos que sintam a exigência de levar conforto e esperança aos pobres, peço que se empenhem...”.

Aí está o apelo, sem dúvida evangélico, de Francisco. Porém, sua ressonância é relativa, inclusive na Igreja. O discurso de Guedes tem adeptos. [email protected]

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