Patrimônio histórico

Raimundo Bechelaine

Patrimônio histórico 

A região Centro-Oeste mineira não é rica em monumentos históricos e artísticos que gozem de reconhecimento ou atração em âmbito estadual ou nacional. Talvez porque, de fato, não existam. Ou então, por serem desprezados e destruídos por nós mesmos. Isto não significa, entretanto, que possamos partir para a política de terra arrasada, acabando com o que resistiu aos golpes da nossa ignorância e descaso.

O bom exemplo vem de perto, do além Pará, do Conselho do Patrimônio Histórico e Artístico de Carmo do Cajuru. A Municipalidade e o Comphacc, com anuência da Mitra Diocesana, fizeram o tombamento da antiga Capela de São José, do século 19, de perfil colonial, situada na Praça Maria Colodina, no Distrito de Salgado. O decreto saiu em 17 de março, assinado pelo prefeito Edson Vilela, pela secretária de Educação e Cultura, professora Kênia Dias Nogueira, e pelo procurador do Município, Alessandro Brandão Schmitt. 

O texto referiu-se também ao entorno da Capela, enfatizando construções ali existentes: "o entorno do imóvel caracteriza-se por abrigar (...) edificações de valor histórico e cultural que deram início ao povoamento do Distrito de São José do Salgado." Entre estas, está a casa-sede da fazenda do Sr. Melquíades Batista Gomes de Miranda, na rua que hoje tem o nome dele, defronte à Capela. É autêntico exemplar das antigas residências rurais mineiras, em estilo sóbrio e sólido. Felizmente, vem sendo bem conservada pelos proprietários.

Eis o que diz o escritor Geraldo Moreira, de São Gonçalo do Pará, ex-membro da Academia Divinopolitana de Letras: "Chegando ao Salgado à boca da noite, ali tiveram que pernoitar; e o fizeram na casa do Cel. Melquíades Batista Gomes, o patriarca de São José dos Salgados. Sô Merco, como era carinhosamente chamado por quantos o conheciam, era influente chefe político, filiado às hostes do PRM, partido que elegeu Artur Bernardes presidente da República. Mantinha relações epistolares com o presidente da República, relações tão estreitas, que nenhum moço salgadense prestava serviço militar. Bastava ser sorteado um rapaz do lugar, e o chefe político, a instâncias dos pais do sorteado, mandava uma carta a Artur Bernardes e a dispensa vinha por via telegráfica. Sô Merco era autoridade máxima no arraial e também hospedeiro de todo forasteiro que lá chegasse. Para isso, dispunha de acomodações para viajantes, sem cobrar um real pela hospedagem." (História e Estórias da Minha Terra, Ed. do Autor, 1990, pág. 100)

O próprio Bernardes ali esteve, nas andanças da campanha presidencial. A hospitalidade do casal Melquíades e Ermelina beneficiava toda a população. Lá ficavam os padres, quando vinham atender os fiéis; e também eventuais agentes de saúde para vacinar a gente. Dentistas ambulantes montavam os gabinetes na sala de visitas. Até bispos de Mariana, em visitas pastorais, eram recebidos.

Em 2001, o ex-presidente e governador de Minas, Itamar Franco, veio  inaugurar a ligação asfáltica com a MG-50. Acompanhava-se do secretário de Cultura, Ângelo Osvaldo de Araújo. A sensibilidade atenta do secretário fez parar a comitiva. Ele, o governador e os acompanhantes observaram o logradouro. Em Cajuru, manifestaram suas impressões ao pároco e ao prefeito, concluindo: "Aquilo precisa ser preservado." 

Mais uma vez, o Sr. Ângelo Osvaldo é prefeito de Ouro Preto. Será certamente convidado para padrinho, na festa que se fará em Salgado, quando a pandemia permitir. Como no passado, haverá o acolhedor café da roça, nas salas do solar de D. Ermelina e Sô Merco.   [email protected]




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