O paradoxo das redes

Com o surgimento das redes sociais, as pessoas que antes não podiam se manifestar ganharam voz. Problemas que antes eram abafados e varridos para debaixo do tapete começaram a ser expostos. Todos comemoraram essa nova ferramenta e a liberdade de expressão que ela permite. Infelizmente, alguns começaram a usar estes mecanismos para o mal.

Hoje, além der ser um excelente canal para reivindicar direitos, acompanhar e fiscalizar a política, denunciar injustiça e colocar questões polêmicas em debate, as redes sociais também se tornaram palco de injúrias, calúnias, difamação, ofensas e até favorecimento da criminalidade.

Foi pelo fato de a internet ter se tornado uma terra sem lei que a lei precisou agir e se fazer valer nestes espaços e, por isso, começaram a surgir marcos regulatórios e ações na Justiça para definir algumas questões que estavam ultrapassando o limite do bom senso e se tornando abuso.

A mais recente decisão foi um tiro no pé dos grupos de WhatsApp. Desde o uso mais inocente, até os de fins políticos, agora todos estão na mira dos advogados que ganharam uma nova área de atuação. Foi definido que administradores de grupo deste aplicativo podem ser responsabilizados pelas postagens que os membros fizerem. Em são Paulo, um administrador teve de indenizar em R$ 3.000 uma mulher que foi chamada de “vaca” no grupo que ele comandava. Em Divinópolis, um jovem também teve de prestar esclarecimentos porque postaram uma foto íntima não autorizada no grupo. Ele nem sabia que estava como administrador. O criador saiu e o aplicativo escolheu este jovem para a função. Mesmo sem saber, ele se envolveu em uma grande confusão.

A decisão pode soar exagerada para alguns, mas não existiam mais ferramentas que pudessem conter este tipo de abuso e, por causa do mau uso que alguns fizeram das redes, acabaram penalizando todos. O fato de existirem grupos que avisam onde a polícia está, dificultando a prisão de bandidos, é inadmissível. É também irônico e paradoxal. Os mesmos que criticam a falta de segurança, por causa de um IPVA vencido, estavam usando este mecanismo e sem querer facilitavam a ação dos bandidos.

Na política, as redes se tornaram metralhadoras nas mãos de cegos. Atira-se para todo lado e acertam muita gente, até de maneira injusta. Gente que perdeu eleição começou a usar grupos e páginas para atacar quem ganhou, tentando “queimar” o mandato destas pessoas para assim ter mais chance em uma próxima eleição. Grupos políticos passaram a espalhar notícias falsas para prejudicar candidatos.

Começaram boatos sobre tudo e todo tipo de coisa. Em algumas cidades, campanhas de vacinação chegaram a ser prejudicadas porque espalharam que as vacinas tinham por objetivo eliminar parte da população, espalhar uma doença ou até mesmo infertilizar os pobres. As redes também criaram justiceiros que lincharam uma mulher porque acharam que era bruxa satanista e matava crianças e, na verdade, era uma cristã que, quando morta, carregava uma Bíblia com a foto da filha. Em Divinópolis, um casal que trabalhava tirando fotos em uma van adaptada para esta finalidade quase foi morto porque pessoas usaram as redes para dizer que eles sequestravam crianças.

O excesso puniu. A falta de educação venceu mais uma vez. As redes não deverão se calar, mas deverão perder parte de sua força porque cada vez mais serão criadas medidas para conter abusos. Outro paradoxo surge aí: justos pagarão pelos pecadores para que outros justos não se tornem vítimas do pecado.

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