O outro

Augusto Fidelis

 A cada vez que se liga a televisão, sintoniza uma emissora de rádio, abre um jornal ou uma revista ou páginas da internet não se acha outra coisa senão notícias ruins. Parece que deu a louca no mundo. Aliás, com as devidas exceções, não há mais respeito entre as pessoas. Os maus exemplos começam na cúpula e contaminam toda a sociedade: “Se a farinha é pouca, meu pirão primeiro”, diriam os antigos.

O filósofo, escritor e crítico francês Jean Paul Sartre, que viveu entre 1905 e 1980, conhecido como representante do existencialismo, sentenciou: “O inferno são os outros”. É o outro que atravanca o meu caminho, que rouba a minha farinha, que me inveja, que surrupia o que é meu. Mas o problema é que eu também sou o outro para aqueles que estão próximos de mim. Talvez eu tenha as mesmas atitudes que condeno, quando o malfeito vem do outro.

O outro pode ser um tormento, mas também uma benção. Depende de como a relação é construída. No entanto, quem está na face da terra não pode viver sem o outro. É por isso que na última ceia disse Jesus a seus discípulos: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. Eu devo contribuir para a felicidade do próximo, ao mesmo tempo em que o outro deve contribuir para a minha felicidade. Em geral, os conflitos se originam no egoísmo: eu sou o centro, os demais são servos.

Mas, como eu já disse, repito: impossível viver sem o outro. Senão, analise comigo querido leitor, estimada leitora. Ninguém cai do céu. Para nascer é preciso que haja intervenção do outro, ou seja, o pai e a mãe, que num ato de amor ou de loucura transformam óvulo e esperma em outro ser. Enquanto criança, esse ser precisa do outro para se alimentar, banhar, vestir, aprender a falar e a caminhar, ser amparado.

À medida que cresce, esse ser precisa do outro para se instruir, trabalhar, produzir, vender ou comprar, segundo suas necessidades. Esse ser precisa do outro para dar sentido à sua vida, seja no namoro, no casamento ou no desenvolvimento de uma profissão. Mesmo o religioso celibatário precisa do outro para pregar a palavra de Deus ou exercer o seu altruísmo, porque a fé sem obras é morta.

Mas, quando chega a velhice, tanto quanto na infância, sem o apoio do outro a vida se torna realmente um inferno. É o outro que vai dar banho, trocar a fralda, levar ao médico, dar remédio, colocar no sol ou levar para a sombra. Quando morre, o outro é essencial para que chegue à sepultura.

Aí está o porquê da recomendação de Jesus para que haja amor mútuo entre os membros da comunidade: com amor e por amor, o fardo torna-se muito mais leve e a caminhada suave.

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