O ano do caos e da esperança: os altos e baixos da pandemia

Condições de trabalho no Luto, recorde de mortes e desmobilização de leitos

 Matheus Augusto

Em março de 2020, há quase dois anos, a Secretaria de Saúde (Semusa) confirmava o primeiro caso de covid-19 em Divinópolis. Era o início de uma pandemia de proporções ainda desconhecidas, tão misteriosa quanto sua cura. Enquanto o ano anterior ficou marcado por obscuridade, 2021 se iniciou com a esperança da chegada das primeiras doses de vacina, os tímidos lotes de CoronaVac para a alta demanda que havia na época. 

Durante o ano, cobrimos todas as óticas da pandemia: partindo da mobilização e desmobilização de leitos, passando pelos revogações e publicações de decretos com novas restrições ou flexibilizações, relatando as dificuldades enfrentadas pelos setores da economia e revelando o cansaço e desgaste por trás das máscaras dos profissionais de saúde. Entre gráficos, imagens e relatos, a cidade viu o número de mortos pela doença e suas novas variantes despencarem com o avanço da vacinação.

 

Janeiro

Após semanas de espera, uma data. Em 27 de janeiro, a Semusa aplicou a primeira dose na cidade, em cerimônia no Centro Administrativo. A escolhida foi Fernanda Candida da Costa, técnica em enfermagem, de 34 anos, que atuava na UTI e enfermaria do Hospital de Campanha contra a covid-19 em Divinópolis, desde o início de suas atividades. Desde então, mais de mais de 400 mil doses foram aplicadas.

Gleidson Azevedo (PSC) assumiu a cidade na onda vermelha, com o comércio fechado e eventos proibidos. Em seu primeiro discurso, durante a posse na Câmara,  lamentou a decisão de seu antecessor, Galileu Machado (MDB), em adotar a onda vermelha na última semana de governo.

Em janeiro, alguns vereadores, inclusive, sugeriram a instalação de uma barreira sanitária nos pontos de acesso à cidade para controlar a entrada de visitantes com covid-19 e, consequentemente, evitar a necessidade de fechamento da cidade.

Devido às limitações de doses, a vacinação seguia grupos prioritários e por idade. Janeiro se encerrou, até aquele momento, como o mês mais letal da pandemia, com 27 mortes.

 

Fevereiro

No segundo mês, o Agora expôs a agonia dos pacientes que aguardavam há mais de três semanas por uma cirurgia ortopédica, dada a suspensão das cirurgias eletivas e alta taxa de ocupação hospitalar por covid-19, deixando pacientes de outras doenças sem leitos.

Em fevereiro, devido à superlotação de outros municípios, a cidade começou a receber ainda mais pacientes de fora. Em 14 de fevereiro, por exemplo, foram cinco transferidos de Coromandel para a cidade. 

Nessa época, surgiu a primeira de uma série de reportagens que o Agora produziu ao longo do ano sobre as condições de trabalho dos servidores do Serviço Municipal do Luto. Na primeira, agentes denunciavam o temor da contaminação por manusearem os corpos de vítimas da covid-19 sem luvas adequadas. Os macacões, por outro lado, eram emprestados pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). 

 

Março

O efeito da vacinação, devido ao intervalo entre duas doses e baixo fluxo do envio de vacinas, não era imediato. Em março, a pandemia dava sinais de piora e Divinópolis voltou à onda vermelha. No dia 11, o secretário de Saúde, Alan Rodrigo, alertava: “Estamos à beira de um colapso”. Referência na macrorregião Oeste, composta por 1,2 milhão de moradores, Divinópolis contava com apenas 11 leitos de Centro de Tratamento Intensivo (CTI). 

Quando não havia mais degraus para descer, criou-se mais um: a onda roxa. Em 13 de março, a cidade regrediu para o mais rígido protocolo do Minas Consciente. Apenas no fim de abril, o município avançou para onda vermelha. E, desde então, passou a avançar gradativamente, até chegar à verde, na qual permanece há mais de três meses.

Dia 24. O colapso anunciado pelo secretário tornava-se realidade. A ocupação do hospital de campanha chegou a 300%, com 165 pessoas à espera de vaga. 

No mesmo mês, familiares de detentos do presídio Floramar denunciaram, ao Agora, possível surto na unidade prisional. Os internos estavam alojados sem máscara. A situação foi negada pelas autoridades responsáveis.

 

Abril

O mês mais cruel da pandemia. 123 vidas ceifadas pela covid. Famílias em luto em uma cidade que tentava retornar à normalidade após deixar a onda roxa. Enquanto as portas do comércio eram abertas, covas eram fechadas. 

 

Junho

Em junho, com a UPA sem vagas, autoridades políticas cobravam do Estado a abertura de leitos de covid-19 no Hospital Regional. Apesar de indícios positivos, o desejo nunca foi atendido.

O mês também ficou marcado pela contaminação de membros do alto escalão do Executivo, como o próprio prefeito Gleidson Azevedo (PSC), e no Legislativo, vereadores. 

Nesse período, os indicadores davam sinais de melhora. Com o avanço da vacinação, que ainda não tinha previsão de imunizar adultos sem comorbidades, a morte de idosos caiu 43%.

A Prefeitura anunciou, ainda, a abertura de processo administrativo contra o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Social (IBDS), gestor da UPA, após denúncias de falta de medicamentos e uso incorreto de oxigênio.

Ao fim daquele mês, Divinópolis chegou à trágica marca de 500 mortes por covid-19 desde o início da pandemia.

 

Julho

Uma vela para cada vítima da doença foi colocada na escadaria da Praça do Santuário em homenagem. 

Em 30 dias, a cidade aplicou 40 mil doses e continuou a observar as internações despencarem até 23%. 

Em julho, os deputados também aprovaram, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), o acordo entre o governo e a Vale. Entre os valores, assegurou-se os recursos para o término do Hospital Regional, ainda sem data para retomada das obras. 

Com a constante queda dos indicadores, o Estado iniciou a desmobilização de leitos exclusivos para pacientes com covid-19 na macrorregião.

 

Agosto

Após oito meses, Divinópolis voltou à onda verde. A melhora dos indicadores regionais e locais permitiu o avanço, que não ocorria desde dezembro passado.

A cidade também recebeu a notícia do início da aplicação da terceira dose no mês seguinte.

 

Setembro

Cansaço e falta de ar. Pacientes recuperados da covid-19 contaram, em reportagem especial do Agora, os principais sintomas da doença e o processo de recuperação, inclusive com fisioterapia. 

Nessa época, o secretário de Saúde, Alan Rodrigo, já sinalizava a possibilidade de desmobilização de leitos do hospital de campanha. O Estado, inclusive, chegou a cortar 18 leitos covid do Complexo de Saúde São João de Deus.

A vacinação de adolescentes com comorbidades e o reforço em idosos também foi paralisada momentaneamente pela escassez de doses.

No Luto, nova denúncia: “‘carteiradas’ de vereadores e membros da Prefeitura são comuns no Serviço Municipal do Luto”, afirma fonte.

Em 15 de setembro, um novo marco na luta contra a covid-19: o início da vacinação de adolescentes com 17 anos. O tema, inclusive, gerou polêmica. O processo foi suspenso por determinação do Ministério da Saúde, que alegou investigação de morte relacionada à vacina ‒ que não foi confirmada. Pouco depois, a situação voltou ao normal.

Autoridades voltaram a cobrar agilidade do governador Zema (Novo) no Hospital Regional. O governador se comprometeu a acelerar processo para retomada das obras

 

Outubro

Os índices de contaminação continuavam a cair. Em outubro, a Semusa divulgou que o mês anterior registrou o menor número de casos confirmados de covid no ano. Quase metade da população já havia recebido a segunda dose.

O mês marcou o encerramento do primeiro dos três drive-thru em funcionamento, o do Divinópolis Clube. 

No período, a cidade chegou a ficar quase 15 dias sem registrar nenhuma morte pela doença e ficar com a ocupação hospitalar abaixo de 8% ‒ menor índice do ano.

Outubro terminou com uma decisão que já se desenhava pelo desgaste: a rescisão do contrato do IBDS, que permanece até hoje na administração da UPA até a conclusão de um novo processo licitatório, já em andamento.

 

Novembro

Pouco a pouco, as estruturas de enfrentamento à covid-19 foram desaparecendo da cidade. Após se tornar símbolo da luta contra a doença, o Estado determinou a desmobilização dos leitos do hospital de campanha. A Prefeitura também encerrou o drive-thru da Emop. 

Ainda em novembro, a Semusa divulgou dado assustador: mais de 12 mil divinopolitanos estavam com a segunda dose em atraso. 

 

Dezembro

O último mês do ano ficou marcado pela identificação da nova variante, a Ômicron. A preocupação forçou o adiamento de medidas previstas para o mês, como a desobrigação do uso de máscaras em locais públicos e abertos. 

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a vacina do laboratório da Pfizer para aplicação em crianças entre 5 a 11 anos. A expectativa é que o processo tenha início já em janeiro. 

Por fim, a Prefeitura iniciou a vacinação contra o coronavírus em postos de saúde. Inicialmente, apenas 16 unidades eram contempladas. Dias depois, 27. E, a partir de 3 de janeiro, todas aplicarão a vacina (conforme estoque de disponibilidade).

Com o processo de transição, o Executivo encerrou as atividades do terceiro e último drive-thru, do Centro Administrativo. 

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