Novos tempos, novas relações de empregos e os direitos, como ficam?

A comodidade proporcionada pelos smartphones, aliada ao assolador desemprego que se instalou nos últimos anos no país, tem provocado significativa mudança nas relações de trabalho.

Atualmente os aplicativos de transporte e de entrega de comida arregimentam mão de obra barata, devido à facilidade de cadastramento em suas plataformas, flexibilidade de horário, ausência de “patrão”, mas que ficam à margem da tutela das leis trabalhistas.

Os “atrativos” proporcionados por essa nova forma de consumo global, herança da revolução digital, cobra, não raramente, um preço alto, que não é percebido pelos que foram seduzidos ou obrigados a se valer desta oportunidade de trabalho para complementar a renda familiar ou prover o sustento dos seus dependentes.

Essa “uberização” do trabalho exige jornadas de labor extenuantes, ultrapassando 8 horas diárias. Além disso, a maioria dos cadastrados não se encontra sob o salvaguardo previdenciário, o que é preocupante, já que as operadoras destes aplicativos faturam muito e lucrarão ainda mais nos próximos anos.

Já ouvi inúmeras pessoas tecerem críticas severas acerca dos produtos oriundos da China, por causa da utilização da mão de obra quase escrava. No entanto, ao se valer dos aplicativos de transporte e de entrega de comida também não se está fomentando uma nova forma de trabalho desprovida de qualquer direito trabalhista?

Algumas poucas decisões emanadas de Varas do Trabalho Brasil afora têm declarado o vínculo empregatício entre estes trabalhadores e algumas empresas de aplicativo de transporte e de comida, mas a jurisprudência ainda não se consolidou, dados os pormenores que envolvem essa nova relação de trabalho.

Recentemente a Justiça do Trabalho espanhola condenou uma empresa de origem inglesa responsável por entrega de comida a reconhecer o vínculo de emprego para com os profissionais cadastrados em sua plataforma para executar serviços de entrega.

Não se pode perder de vista que os aplicativos proporcionam aos seus cadastrados uma perspectiva de renda em curto e médio prazo, ainda que a maioria atue da informalidade. Mas isso, por si só, não pode servir de subterfúgio para se evitar uma discussão mais aprofundada sobre a questão, principalmente em nível legislativo e judiciário.

Em tempo pregresso, o Poder Judiciário enfrentou questão relativa à contratação fraudulenta de trabalhadores por meio da constituição de pessoas jurídica, com o objetivo precípuo de desvirtuar a relação de emprego, e firmou entendimento que se alicerça nos fundamentos constitucionais e na norma celetista, ou seja, declarou a existência do vínculo de emprego nesses casos.

O valor social do trabalho e a dignidade da pessoa humana são pilares da afirmação do Estado Democrático de Direito, motivo pelo qual toda reflexão é bem-vinda para evitar que o capital vilipendie direitos duramente conquistados.

Gustavo Henrique de Rezende – Advogado e tesoureiro da 48ª Subseção da OAB/MG.  E-mail: [email protected]

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