Nosso luto indignado

Raimundo Bechelaine

Nosso  luto  indignado

Passa de um ano desde que a peste da covid-19 se instalou em nosso país. Felizmente, a maioria dos acometidos pelo vírus se salva, embora muitos fiquem com sequelas que a medicina ainda não sabe até onde irão. Milhares mais poderiam ter-se curado, se tivéssemos um governante capaz de coordenar as ações de defesa, como se vê na maioria dos países. Nossos governadores, prefeitos e autoridades sanitárias fazem o que podem. Ao fim do mês, estaremos chegando aos quatrocentos mil mortos. É impossível não pensarmos na dor dos milhões de pessoas  que choram a perda de entes queridos. É impossível não nos sentirmos todos enlutados e também revoltados ante a irresponsabilidade, a incompetência e o cinismo que produzem o genocídio a que assistimos impotentes. 

A esta altura, não há quem não tenha perdido alguém das suas relações mais ou menos próximas, sejam eles familiares ou parentes, amigos, vizinhos, colegas de trabalho ou apenas conhecidos. Neste sentido, todos já fomos atingidos. De nossa parte, havíamos perdido uma prima, em agosto, a última proprietária e moradora da casa de nossos bisavós, em São José dos Salgados, além de outras pessoas menos próximas. 

Eis que, semana passada, chega-nos de São João del-Rei a comunicação do falecimento de um amigo querido, padre Ramiro José Gregório. Com diagnóstico positivo de covid em março e hospitalizado naquela cidade, veio a falecer na madrugada de 17 de abril, sábado passado, aos 76 anos. Era nascido em Itabirito, onde seu pai era maestro da banda de música.

Foi em setembro de 1983 que nos conhecemos, no Aeroporto de Confins, quando partíamos para Roma, a fim de continuar nossos estudos. Ele faria o mestrado em liturgia, no Instituto Santo Anselmo. Seu temperamento alegre e comunicativo facilitou a nossa aproximação. Nos períodos de férias, fizemos algumas viagens inesquecíveis. Ao Egito, no mês do Ramadã de 1984. Mais tarde, à Grécia, à Alemanha e Bélgica. Quando retornou, assumiu a Paróquia do Santuário do Senhor Bom Jesus, em Belo Horizonte. Cuidava com minucioso esmero das celebrações litúrgicas. Criou ali um belo coral.  Em ocasião festiva da Paróquia de Nossa Senhora do Carmo, em Cajuru, veio com seus cantores entoar um solene Te Deum.

O gosto pelas tradições e belas liturgias o levou a transferir-se para São João del-Rei. Lá encontrou o seu ambiente, seu habitat, onde se realizava plenamente. Era vigário paroquial na Catedral do Pilar. Celebrava mensalmente uma missa no rito tridentino. Tornou-se diretor do Memorial do Cardeal Dom Lucas Moreira Neves e membro efetivo da Academia Sanjoanense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico. O falecimento de padre Ramiro nos causa intensa consternação e a toda a cidade de Bárbara Heliodora e Tancredo Neves. 

Para ampliar nossa tristeza, recebemos, enquanto escrevíamos este texto, outra notícia de luto. A covid levou-nos Flávia, esposa do Dr. Og Francisco do Couto Sousa, filho do casal Hamilton (já falecido) e Dulce, residente em Divinópolis. Og Francisco doutorou-se em biologia na Inglaterra. Ele e Flávia são professores e pesquisadores na Universidade Federal de Viçosa. Um sentido abraço ao querido Og e aos familiares. [email protected] 

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