Não faz muito tempo

Editorial

Não faz muito tempo, mas o Brasil tornou-se um país intolerante, um país intolerante a tudo. Segundo o dicionário, a palavra intolerante significa: “uma atitude mental caracterizada pela falta de habilidade ou vontade em reconhecer e respeitar diferenças em crenças e opiniões. Num sentido político e social, intolerância é a ausência de disposição para aceitar pessoas com pontos de vista diferentes”. Não toleramos pessoas com religiões e crenças diferentes que as nossas. Não toleramos pessoas com visões políticas diferentes das nossas. Homens não toleram mulheres. A sociedade não tolera a comunidade LGBTQ, não tolera os negros, não tolera os pobres. A sociedade não tolera mais nada, a não ser aquilo que ela padroniza como o certo, como o ideal, esquecendo-se muitas vezes que o sentido da vida está na diferença, que deve ser respeitada todos os dias, todos os minutos.

Não faz muito tempo, mas o Brasil tornou-se um país hipócrita. Um país povoado por hipócritas. Hipócritas esses que gritam ser contra a corrupção, quando eles mesmos estão com as mãos sujas. Hipócritas estes que defendem estado mínimo, quando milhões de pessoas não têm renda suficiente para comer. Hipócritas estes que se dizem contra o aborto e depois gritam que as mulheres só querem ter filhos para viver de Bolsa Família.

Não faz muito tempo, mas o Brasil tornou-se o país da individualidade. Se eu estou empregado, pouco me importa os 13 milhões de brasileiros que estão à procura de uma oportunidade de trabalho. Se eu tenho a minha casa, pouco me importa os milhões que pagam aluguel, e os outros milhões que moram nas ruas. Se eu tenho condições de pagar plano de saúde, pouco me importa os milhões que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS) e, muitas vezes, morrem na fila, à espera de uma consulta ou de um procedimento cirúrgico.

Não faz muito tempo, mas um abismo se abriu no país e, talvez, esse abismo nunca mais consiga ser fechado. Não faz muito tempo, mas os brasileiros se dividiram em um fanatismo político – que beira a loucura – denominado “direita e esquerda”, que não leva ninguém para lugar nenhum. Não faz muito tempo que o povo brasileiro, além de ter se tornado intolerante, hipócrita e dividido neste abismo, anda em círculos. E, em meio a este cenário, a pergunta de hoje é: falta muito para o povo descobrir que círculos não levam a lugar nenhum? Que gritos não resolvem? Que a intolerância não deve ser tolerada? Que ter um pensamento não lhe dá o direito de se impor ao outro? Falta muito tempo para que o povo descubra que se dividir não é a solução para os problemas do país? Muito pelo contrário, talvez seria a união que o colocasse de novo nos trilhos?

Vivemos tempos loucos, apaixonados, irracionais, regados de muita rede social, muita opinião, muita fake news, muita hipocrisia e muita intolerância. Vivemos tempos de círculos viciosos, formados por um povo que é simplesmente massa de manobra, de uma classe que pouco se importa com quem está neste círculo. Não faz muito tempo, mas o povo deixou de raciocinar para se apaixonar, e essa paixão não está levando o Brasil a nada.

 

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