Não existe almoço grátis

 

O que leva 11 vereadores a queimarem seus filmes defendendo um prefeito supostamente flagrado em diálogos um tanto quanto duvidosos? O que os faz quererem criminalizar o denunciante em vez de se aterem ao conteúdo da denúncia, e ao que diz o denunciado nas evidências reunidas pelos autores do pedido de cassação? Conforme o Agora detalha na capa e na página 3 de hoje, apenas cinco vereadores afirmaram ter visto algo substancial no teor dos áudios divulgados por Marcelo Máximo de Morais, o Marreco, ex-aliado de Galileu Machado (MDB).

Sob vaias, gritos e xingamentos, Ademir Silva, César Tarzan, Delano Santiago, Eduardo Print Júnior, Josafá Anderson, Rodrigo Kaboja, Marcos Vinícius, Nêgo do Buriti, Raimundo Nonato, Renato Ferreira e Zé Luiz da Farmácia indicaram que estão mais ao lado de Galileu que ao lado do povo. Ao que parece, estão ao lado, como o próprio Ademir Silva disse recentemente durante seu pronunciamento na Câmara, das obras e dos cargos que o prefeito dá a quem o protege. Ao livrarem Galileu de uma possível cassação, esses vereadores fizeram, à sua maneira, como aqueles deputados federais que livraram Temer de denúncias por duas vezes, custando R$ 12 bilhões aos cofres públicos, pagos em cargos e benesses de valor inestimável – dentre elas, o afrouxamento da lei de combate ao trabalho escravo, que serviu para beneficiar os parlamentares pecuaristas, que exploram mão de obra barata em suas grandes propriedades.

Mas e os vereadores de Divinópolis? Ganharam o quê? Como será o pagamento? Obras? Cargos na Prefeitura? Não existe almoço grátis. Nenhum político que se preze se submete a tamanho vexame de graça. Principalmente os que miram a reeleição ou a conquista de um cargo mais alto. E os argumentos apresentados por eles são vergonhosos.

Tentaram de tudo — até mesmo desqualificar o caráter do denunciante, como se Galileu já não fosse alvo de inúmeros processos judiciais, inclusive por nepotismo. Tática velha. Em vez de combater o fato denunciado, combate-se o denunciante. Se a denúncia apresentada por Marreco fosse infundada, como alegaram alguns dos nobres vereadores, eles não teriam corrido tanto para acelerar a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e enfraquecer a Denúncia de Infração Político-Administrativo, da Associação dos Advogados do Centro-Oeste de Minas (AACO), rejeitada ontem.

Defender o arquivamento do pedido de cassação sob o argumento de que não se sabe se as gravações são verdadeiras é surreal. A simples aceitação da denúncia não implicaria na imediata cassação de Galileu. Esses 11 vereadores se omitiram do papel de representar o povo no Poder Legislativo – que é a função essencial do cargo que eles ganharam nas urnas. Afinal, o povo quer resultado, quer representatividade. O presidente Adair Otaviano (MDB) pode ter instaurado a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o teor das gravações. Mas isso não terá o mesmo efeito que poderia decorrer da aceitação da denúncia, porque ainda não se sabe de CPI local que tenha tido resultado concreto – exemplo é a da Copasa, que resultou em um relatório que não resultou em nada.

Agora a associação de advogados que ofereceu a denúncia tentará invalidar a votação de ontem sob a alegação de que Kaboja não poderia ter votado, pois é citado na denúncia. Mesmo que consiga e a votação ocorra novamente, os vereadores que fizeram pactos de sangue com o prefeito poderão renová-los. Desta vez, porém, muito mais desgastados diante da opinião pública.

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