Murilo Mendes aos 120

Raimundo Bechelaine

Murilo Mendes aos 120

Divinópolis é terra de poesia e poetas. São muitos, como Sebastião Benfica Milagre, Adélia Prado, Osvaldo André e tantos mais. Um deles, o Lopes, Carlos Antônio Lopes, acaba de nos dar um livro novo. Nos salões do ginásio São Geraldo, nos anos sessenta, ouviam-se Milagre e Carlos Altivo; o primeiro declamando seus próprios versos e o segundo, a "Nega Fulô", do sergipano Jorge de Lima. Será, pois, sempre oportuno celebrar aqui a obra e memória dos poetas. 

Por que não é tão conhecido nem admirado entre nós quanto Drummond, se ele é reconhecidamente um dos maiores poetas brasileiros? Eis aí a pergunta que daria um bom debate literário e, melhor ainda, exigirá estudo e pesquisa apurados. Daria até argumento para tese de doutorado.

Foi em Juiz de Fora que nasceu Murilo Monteiro Mendes, em 1901. Exatos cento e vinte anos completaram-se na semana passada, a 13 de maio. Dia da  abolição da escravatura, ele gostava de lembrar. Sua mãe era mulher culta e tinha nome bem soante: Elisa Valentina Monteiro de Barros. Onofre Mendes, o pai, era funcionário público. São sobrenomes importantes na aristocrática cidade onde, não por acaso, seria fundada a Academia Mineira de Letras, em 1909.

Morreu-lhe a mãe em outubro de 1902, quando ele contava apenas um ano e poucos meses de nascido. O pai casou-se com outra Monteiro. A respeito desta, escreveria ele: "Minha segunda mãe, Maria José, grande dama de cozinha e salão, resume a ternura brasileira. Risquei do vocabulário a palavra madrasta". Quando tinha nove anos, a passagem do cometa Halley o impressionou. Na infância e juventude, seria contemporâneo de marcos históricos como a "belle époque", o naufrágio do Titanic, a primeira Guerra Mundial, a Revolução Russa. No Brasil, a "política do café com leite", a Semana de Arte Moderna e a fundação do Partido Comunista, a Revolução de Trinta, o Integralismo de Plínio Salgado, as conversões de Jackson de Figueiredo e Alceu Amoroso Lima ao catolicismo. 

Desde pequeno, foi acometido dos bons vícios da leitura e da escrita. Em 1920, começou a escrever uma coluna sob o título: "Crônica Mundana", no jornal "A Tarde", de Juiz de Fora. Um ano depois, mudou-se para o Rio de Janeiro. Frequentava os círculos intelectuais e artísticos da Capital e tornou-se amigo do pintor Ismael Nery. Continuou a escrever para "A Tarde", mas a coluna passou a chamar-se "Bilhetes do Rio". 

Em 22, a partir da Semana de Arte Moderna, a corrente modernista consolidou-se no Brasil, abrindo horizontes novos para os nossos artistas, na literatura, pintura, arquitetura, teatro, cinema e artes plásticas em geral. Murilo integrou-se no modernismo e passou a publicar nos veículos do movimento. Aproximou-se do surrealismo e passou a escrever poemas. 

Em 1930, publicou o primeiro livro: "Poemas", por uma editora de Juiz de Fora. A obra foi bem recebida e deu-lhe o "Prêmio Graça Aranha" de poesia. A partir de então, deu a público muitos livros de poesia e prosa. Nessa década, aproximou-se do grupo parisiense da revista "Esprit", liderado por Emmanuel Mounier, filósofo da esquerda católica.

Em 34, em parceria com o amigo Jorge de Lima, publicou "Tempo e eternidade". Aí já transparece sua retomada da fé católica. A partir de então, lançou muitos livros de poesia e prosa. Eis apenas alguns dos seus  títulos: Poesia em pânico, Mundo enigma, Sonetos brancos, A idade do serrote, Contemplação de Ouro Preto, Italianíssima, Tempo espanhol. Há muitos mais.

Casou-se com a portuguesa Maria da Saudade Cortesão. Passou quatro anos na Europa, onde fez conferências em universidades. Seu nome já era internacional. Retornou ao Brasil, porém mudou-se definitivamente para a Itália, onde se tornou professor de literatura brasileira na Universidade de Roma. Em 1972, foi-lhe concedido o "Prêmio Internacional Etna-Taormina de Poesia". 

Morreu na casa do sogro, em Lisboa, em 1975, e foi ali sepultado, no Cemitério dos Prazeres. Nome pitoresco para um cemitério. Sua obra está traduzida em várias línguas. Eis aí um mineiro cosmopolita, que se deve necessariamente ler.  [email protected]

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