Mobilidade urbana: a luta para se locomover entre buracos e mesas

Maria Tereza Oliveira

Andar pelas ruas da cidade é uma tarefa considerada corriqueira e inofensiva. No entanto, para algumas pessoas, a simples ação se torna um desafio. Isso porque os buracos, irregularidades e objetos depositados nas calçadas dificultam o trânsito de cadeirantes, deficientes visuais e mães com carrinho, por exemplo. Por isso, o Projeto de Lei Ordinária do Executivo Municipal (Plem) 49/2019, que tem como intuito a criação do Plano de Mobilidade Urbana do Município de Divinópolis (Planmob), aprovado na reunião de terça-feira na Câmara, veio como um bote salva-vidas.

A proposta trouxe uma reflexão sobre quais são as principais dificuldades encontradas para locomoção nas ruas de Divinópolis. O Agora ouviu um deficiente visual e uma mãe que precisa empurrar carrinho de bebê para entender as principais dificuldades deles em relação ao tema. Calçadas esburacadas ou “interditadas” por mesas de bar e o transporte coletivo estão entre as reclamações mais recorrentes.

O projeto aprovado na terça por unanimidade regulamenta as políticas para mobilidade e acessibilidade contidas no Plano Diretor Participativo da cidade. 

Calçadas esburacadas

Lívia Maria Soares é mãe de primeira viagem de uma menina de dez meses. Por não ter carteira de motorista, ela precisa andar a pé empurrando o carrinho para se locomover.

— A gente não presta muita atenção nos buracos das calçadas quando não tem dificuldades, mas, depois que eu virei mãe, percebi o quão difícil é transitar pela cidade — comparou.

Lívia alegou que é preciso fazer “malabarismo” para conseguir andar com a filha pelas calçadas e, muitas vezes, prefere carregar a bebê nos braços.

— Em algumas ruas, há tantos buracos nos passeios que, mesmo tendo de lidar com o peso da minha filha nos braços, pelo conforto dela, prefiro deixar o carrinho em casa. Acaba sendo mais prático carregar do que ter de desviar das crateras — afirmou.

Para o presidente da Associação dos Deficientes do Oeste de Minas (Adefom), Carlos Roberto Beto da Silva, os buracos nas calçadas causaram um prejuízo enorme. Há dois meses ele mesmo sofreu um acidente.

— Eu caí em um buraco e quebrei a perna. Os problemas com as irregularidades, degraus e, principalmente, buracos atrapalham muito a gente — lamentou.

Carlos está usando muletas e, por isso, está sem sair de casa enquanto se recupera do acidente.

— Espero que as calçadas recebam um “carinho” maior e fiquem em estado mais transitável para a população — sugeriu.

Disputando espaço com objetos

Mesas de bares nos passeios divinopolitanos são um cenário comum. Neste ano, a Câmara apreciou duas vezes projetos sobre o tema. A primeira votação, em março, aprovou o Projeto 002/2019, de autoria do vereador Roger Viegas (Pros), mas o prefeito Galileu Machado (MDB) vetou a proposta por constar o dizer “máquinas de assar” na alteração do artigo 1º. O veto foi derrubado pelos edis.

No entanto, com o intuito de não gerar dupla interpretação, em agosto, os parlamentares apreciaram e aprovaram a proposta 39/2019, apresentada novamente por Roger.

Apesar de permitir o uso de bistrôs em passeios e praças públicas, o projeto tem algumas especificações quanto ao uso das calçadas.

O texto da lei especifica que “a colocação de mesas, cadeiras ou similares, em passeios e praças públicas do Município só será permitida mediante licença concedida pela Fundação Municipal do Meio Ambiente”. Na época, o vereador autor destacou que o intuito era dar mais espaço nos passeios para os transeuntes e, ao mesmo tempo, não prejudicar os estabelecimentos.

Todavia, de acordo com Lívia, ainda há muitos estabelecimentos que ocupam toda a calçada com mesas.

— Até quando você está andando nas ruas sem carrinho e sem bebê já é complicado ter de desviar das mesas e dos garçons, imagina com um carrinho ou uma pessoa cadeirante? Falta mais do que noção, falta empatia. É preciso pensar que o lugar onde você está colocando suas mesas não é feito para tal. Você está invadindo o espaço dos pedestres — contou.

Carlos também tem reclamação similar. Ele destacou que estabelecimentos e ambulantes têm monopolizado os espaços que são destinados aos pedestres.

— Há comércios que chegam a colocar geladeiras nas calçadas. Não vejo problema em usar os passeios, mas falta organização. Talvez se os ambulantes, por exemplo, ficassem de 50 em 50 metros e colocassem suas barracas próximas ao meio fio, seria mais fácil. E, para evitar que eles fiquem no sol, seria necessária uma padronização das barracas — sugeriu.

Transporte público e sinais de áudio

Para Lívia, a forma mais fácil de se locomover em Divinópolis é, atualmente, por ônibus, mas faz uma ressalva.

— O que torna mais fácil é a população. Quando pego ônibus com bebê, mesmo se estiver lotado, sempre alguém cede o lugar. No entanto, eu nunca nem tive coragem de arriscar pegar ônibus com carrinho. Imagino que seja quase impossível. Eu nunca nem vi algum carrinho dentro do ônibus, deve ser por não ter um local para deixá-lo, já que nunca se sabe se o ônibus vai estar lotado — refletiu.

Carlos também apontou para outro problema da mobilidade em Divinópolis: sinais de áudio nas garagens.

— Principalmente no Centro há muitas que não usam ou estão com o sinal de áudio estragado. Como consequência, é comum que algumas pessoas levem “esbarrões” de veículos. Eu mesmo já perdi as contas de quantas vezes isso aconteceu comigo — lembrou.

Plano de Mobilidade Urbana

O projeto aprovado na terça é de autoria da Prefeitura, em parceria com entidades, incluindo a Adefom, além de fóruns de discussão. O Plano de Mobilidade Urbana do Município de Divinópolis (Planmob) estabelece objetivos, princípios, diretrizes, abrangência e estratégias da mobilidade urbana, em cumprimento ao determinado na Lei Federal 12.587, de 3 de janeiro de 2012.

De acordo com o texto do projeto, o Planmob tem por finalidade “orientar as ações do Município acerca dos meios, serviços e infraestrutura de transporte que garantam o deslocamento de pessoas e bens em seu território, além da gestão e operação do sistema de mobilidade, com vistas a atender as necessidades atuais e futuras da população local”.

Carlos Roberto elogiou o projeto e destacou que, com o Planmob, há a possibilidade de mais verbas federais destinadas à infraestrutura, que podem contribuir com a melhoria das calçadas, por exemplo.

— O projeto é muito bom. Agora nos resta acompanhar o cumprimento do que consta na matéria — finalizou.

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