Menos da metade das pessoas são doadoras póstumas

Maria Tereza Oliveira

A doação de órgãos é um assunto polêmico e, embora possa ser de vital importância, sobretudo para pessoas que ficam na fila à espera de um órgão que pode salvar a vida, menos da metade das pessoas são doadoras póstumas. De acordo com dados do Complexo de Saúde São João de Deus (CSSJD), no ano passado, apenas 43% dos pacientes que tiveram morte encefálica tiveram os órgãos doados.

Mesmo com o baixo índice, a opinião das ruas é mais favorável. A maioria das pessoas abordada pelo Agora se posicionou favorável à doação de órgãos e, inclusive, disse que autorizaria que os familiares doassem seus órgãos após a morte. Isso aponta os holofotes para a importância de avisar aos familiares sobre o desejo de ser doador.

Conforme informou o CSSJD, em 2018, dos 253 potenciais doadores, 110 famílias consentiram a doação. Além disso, o Complexo é o 2º maior hospital do estado de notificações por morte encefálica.

Povo fala

A reportagem foi às ruas para saber a opinião dos divinopolitanos sobre o tema. Quase todos se posicionaram a favor de terem os órgãos doados, todavia, nenhum dos ouvidos avisou a família sobre a vontade.

Maria Aparecida Damasceno Silva, 60, se posicionou completamente a favor da doação.

— Apesar de representar o fim para alguém, também significa a continuidade para a vida de outra pessoa. Eu autorizaria com toda a certeza que meus familiares doassem meus órgãos — justificou.

Jorge Cavalcanti Filho, 48, não se considera muito favorável à doação, mas também não se posiciona completamente contra.

— Eu não tenho uma opinião formada sobre isso, sobretudo quando se refere à morte encefálica. Acho que, principalmente para os parentes, é algo muito difícil porque, a partir do momento em que se doam os órgãos, é o fim da esperança — comparou.

Gioventino Aparecido da Silva, 56, acredita que o ato de doar os órgãos após a morte mostra humanidade.

— Eu nem tenho palavras para expressar meus sentimentos de gratidão. Eu autorizaria meus familiares a doarem meus órgãos, pois, é um ato fraterno e, além disso, salva vidas — opinou.

Ele também aconselhou as pessoas que são contrárias à doação.

— Quem ainda não tem esse pensamento, Deus vai trabalhar nesta pessoa. A gente tem de se conscientizar porque é um ato solidário — afirmou.

Cleusa Gonçalves Silva, 54, considera a doação de órgãos essencial.

— A gente tem de se colocar no lugar dos outros. Quando acontece de ter uma pessoa próxima estar precisando de doação, a gente torce para que apareçam doadores compatíveis. Então, é importante ter empatia, porque não vamos mais usar o órgão mesmo. Por isso, é um gesto muito significativo — salientou.

Ela também afirmou que autorizaria a doação de todos os seus órgãos para ajudar o máximo de pessoas.

Márcia Isabel Pereira, 76, enalteceu a coragem da família em doar os órgãos de um ente querido.

— O falecimento de alguém que amamos é devastador, mas é aí que a doação de órgãos se torna uma algo muito útil. Isso porque ela interrompe o fim de um ciclo. Pois, apesar de ser o adeus para uma pessoa, é o sopro de vida para outra — comparou.

Faltam doadores, sobram necessitados

Apesar de menos da metade das mortes encefálicas serem convertidas em doações de órgãos, conforme dados do CSSJD, em 2018 foram efetivadas o total de sete doações de múltiplos órgãos dentro do Complexo, sendo doados córneas, fígado, rins e pâncreas.

Mas, além das doações múltiplas, foram doados 110 pares de córneas. O CSSJD é o único hospital do interior de Minas a realizar a captação de tecidos com profissionais capacitados em Belo Horizonte pelo MG Transplantes.

O complexo informou que não possui o quantitativo dos órgãos mais solicitados no município. Porém, há os dados estaduais que apontam o número de pacientes que ingressaram na fila de espera no ano passado.

A carência que mais aumentou foi de pacientes que esperam córneas. Foram acrescidas 398 pessoas. Em seguida, vieram pessoas que precisam de rins, com um aumento de 341 pacientes. A fila de quem espera a doação de fígado recebeu mais 31 pacientes. Aumentaram 20 pessoas que necessitam de transplante de coração. 12 a mais passaram a precisar da doação de pâncreas e rim. E mais duas pessoas precisam da doação de pâncreas.

Assim, ao todo, 804 pacientes entraram na fila de espera para doação de órgãos no ano passado.

Não basta querer, tem de avisar

Não é necessário estar morto para se tornar doador de órgãos importantes. A doação pode ser feita em vida para membros de família até o quarto grau. Isso inclui pais, irmãos, avós, tios, sobrinhos, primos e netos, além de cônjuges.

Entretanto, além do parentesco, só é possível fazer a doação em com autorização judicial.

Para que isso seja possível, o doador precisa estar em bom estado geral de saúde, ou seja, não ter doença infecciosa ou incapacitante; ter completado a maior idade; a doação não pode comprometer as aptidões vitais do doador; o contemplado precisa estar com indicação terapêutica indispensável de transplante.

Após isso, o doador deve comparecer à unidade hospitalar em que o receptor é acompanhado e fazer exames de compatibilidade. Caso doador e paciente sejam compatíveis, ambos serão encaminhados para acompanhamento multidisciplinar e depois é agendado o transplante.

Para ser um doador póstumo, é importante conversar com a família sobre o desejo de ser doador e deixar claro que eles devem autorizar a doação de órgãos. No Brasil, a doação de órgãos só será feita após a autorização familiar.

Pode haver a doação quando o paciente tiver o diagnóstico de morte encefálica e no caso de doação de tecido. Todo paciente pode ser doador em situação de parada cardiorespiratória, exceto quando houver contra-indicação clínica.

Pela legislação, não há como garantir efetivamente a vontade do doador, no entanto, observa-se que, na maioria dos casos, quando a família tem conhecimento do desejo, este é respeitado.

Por isso, a informação e o diálogo são absolutamente fundamentais, essenciais e necessários. Essa é a modalidade de consentimento que mais se adapta à realidade brasileira. A previsão legal concede maior segurança aos envolvidos, tanto para o doador quanto para o receptor e para os serviços de transplantes.

Os órgãos doados vão para pacientes que necessitam de um transplante e estão aguardando em lista única, definida pela Central de Transplantes da Secretaria de Saúde de cada estado e controlada pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT).

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