Manejar as palavras

Antônio de Oliveira

O cronista é mesmo um escrevinhador do tipo oleiro.

Um ludoterapeuta de palavras.

Sim, a comparação faz sentido.

O resultado de modelagens com as palavras pode resultar numa obra de arte. Embora alguns achem que a crônica seja um gênero literário menor.

Puxando a brasa para a minha sardinha, digo: ledo engano!

Grandes escritores e poetas foram também cronistas.

Rubem Braga, ao que consta, só escreveu crônicas e, nesse gênero, se notabilizou como grande escritor. 

Diante da Queda do Iguaçu, o cronista vive o momento:

“Chegamos, e então tudo aquilo está acontecendo de maneira urgente, o mato, a água, a pedra, o ar”.

Paulo Mendes Campos, n’Um domingo, foi capaz de desvendar a magia de uma lagoa “muda e fechada”, que “compreende as nossas pequeninas desventuras, o efêmero que nos fere”. 

Não resisto a mais uma citação: “Toda a família se extasiou perante a vastidão do oceano, o infinito vivo, esse horizonte sem contorno que parecia nascer dentro de nós” (Mia Couto).

Manejar as palavras como um samurai maneja sua espada. A propósito, consta que, no século XIV, Guilherme Ockham, inglês de origem e franciscano, já então em Paris, dirigira ao príncipe as seguintes palavras: “Imperator, defendas me gladio, ego te defendam calamo”. O imperador o defendesse com a espada que ele defenderia Sua Alteza com a pena, escrevendo. 

Escrevendo...

Segundo Carlos Drummond de Andrade, “escrever é a arte de cortar palavras”. 

Mas tem uma coisa. Se se trata de texto literário, literatura é para degustar, saborear, sorver a arte. Ah! Não apenas consumir o produto. Pergunto:

– Será que fui capaz de formatar qualquer coisa, digamos, uma crônica? 

Com a palavra...

Ah! Manejar as palavras não sem antes congelar, aprisionando-a, a inspiração que vem de dentro de nós. Onde habita o sentimento.

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