Justiça mantém decisão de Prefeitura

Maria Tereza Oliveira

Faltam 15 dias para se esgotar o prazo que a Prefeitura deu aos camelôs para desocuparem o quarteirão fechado da rua São Paulo. Os ambulantes depositavam as esperanças no apoio dos vereadores e na decisão judicial que pode impedir a realocação do camelódromo. No entanto, o juiz Núbio de Oliveira Parreiras, da Vara de Fazenda Pública, negou, no início da noite de ontem, o pedido da Associação Profissional dos Vendedores Ambulantes de Divinópolis (Aprovad), para que a desocupação do camelódromo fosse suspensa.

Dentre outros fundamentos, a sentença deixa claro que o local é de uso comum do povo e que a determinação para a desocupação é ato discricionário da Administração.

“Não há nada perdido”

Ao Agora, a Prefeitura informou ter recebido a decisão com “naturalidade”. Mas a história não acaba aí. Isso porque o advogado autor da liminar pedida pela Aprovad, Robervan Faria, informou que irá recorrer ao Tribunal de Justiça (TJ). De acordo com ele, agora é um momento de calma para pensar como será feito o recurso na tentativa de reverter a situação.

— Não há nada perdido ainda. Os camelôs estão revoltados, mas ainda estamos dentro do prazo e a Prefeitura não tem de comemorar nada. Vou recorrer, tenho fundamento jurídico para tal e, do ponto de vista constitucional, acho que foi uma decisão injusta — disse.

Perturbação

Antes de a decisão ser divulgada, já em clima de feriado, a reunião da Câmara de ontem não contou com a apreciação de projetos. Os destaques ficaram nos pronunciamentos, a começar pela fala da tribuna Daniela Marta Figueiredo, que falou sobre o “verdadeiro trabalho digno”, em referência aos camelôs. Daniela ainda destacou a dificuldade de trabalhar nas ruas como ambulante e criticou o tratamento ofertado à categoria. A vendedora também fez questionamentos sobre a situação do Camelódromo.

“Qual o verdadeiro trabalho digno?”. Esse foi o primeiro questionamento que Daniela fez durante seu tempo na Tribuna Livre. De acordo com ela, ultimamente, os camelôs foram impedidos de trabalhar nas ruas e temem as ações da fiscalização.

— A ordem dos fiscais é passar e carregar [as mercadorias]. Gostaria de saber se é justo a gente ser impedido de correr atrás do pão, da sobrevivência, direito do cidadão, amparado pela Constituição? Queria saber se é justo o fiscal pegar sua mercadoria, como se você não fosse um trabalhador? — perguntou.

Daniela deu como exemplo um senhor que vende salgados com um carrinho. Segundo ela, o cidadão tem dificuldade devido a uma deficiência. No entanto, agora não pode mais trabalhar com seu meio de sobrevivência.

— Isso porque acham que ele perturba. Mas qual artigo de lei ele está infringindo? Porque o cidadão tem de ficar preso a um título de eleitor, mas quando é para exercer o direito dele de trabalhar da forma que pode, ele é proibido — comparou.

Toureiros

Na lei 8.497/2018, que dispõe sobre a regulamentação do comércio ambulante, há a proibição da abordagem forçada aos pedestres como forma de oferecer produtos, pelos agenciadores de vendas, popularmente conhecidos como “toureiros”, agindo fora de suas barracas independentemente de serem contratados ou autônomos.

No entanto, ao passar pela rua, é comum notar que este requisito não tem sido cumprido por alguns e isso se soma à falta de fiscalização por parte do Município. Daniela reconheceu o problema, porém, criticou a generalização.

— Algumas pessoas no camelódromo realmente abordam os pedestres na rua São Paulo, na pressa de arrumar fregueses, aí embaraça “o trigo com o joio” e leva em uma bagagem só. Mas ali tem dezenas de famílias honestas e sinceras que vão atrás do pão de cada dia — ressaltou.

Igualdade

Outro ponto levantado pela ambulante foi a suposta discrepância de tratamento oferecido pelo Poder Executivo em comparação ao destinado a grandes empresários.

— Para que querem nos tirar do quarteirão fechado no dia 1º? Para beneficiar os empresários? O espírito de Natal não pode ser oferecido por igual para toda a sociedade, sendo pobres ou ricos? É porque o pobre vai comprar o presente que pode, com o dinheiro do bolso, e aí vão lhe tirar o trabalho porque são “embaraçados” com aqueles que “perturbam” — disse.

Figueiredo também apontou a suposta falta de relevância que a lei da regulamentação dos vendedores autônomos tem para o Executivo.

— Acho curioso que o prefeito Galileu [Machado (MDB)] sancionou uma lei no ano passado, de autoria do Legislativo, e agora fui informada que o documento não tem valor. Mas se a proposta aprovada e sancionada de um vereador não tiver reconhecimento, então para que os parlamentares vêm aqui [na Câmara] votar projetos? Só para preencher papéis? — ironizou.

Por fim, a ambulante voltou a pedir o apoio dos vereadores para solucionar a situação e lembrou-se do pleito de 2020.

— O cidadão está pagando caro pelos seus direitos. Porque se nós precisamos ter o título [de eleitor] em dia, não é só para conseguir trabalhar, mas também para eleger quem nos represente e lute por nós — destacou.

Comissão

A fala da Tribuna foi elogiada pela maioria dos vereadores. A presidente da Comissão Especial (CE) para tratar do assunto, Janete Aparecida (PSD), lembrou que, na reunião realizada nesta semana, apesar de convocados, não houve representantes do Executivo.

A retirada dos camelôs do quarteirão fechado na rua São está marcada para o próximo dia 1º. A Prefeitura enviou a notificação aos ambulantes no início de outubro, ou seja, menos de dois meses antes do fim do prazo. Após o episódio, camelôs e Prefeitura iniciaram uma queda de braço para decidir o destino do camelódromo.

Formada após a Câmara ser tomada por ambulantes, a CE é composta, além de Janete na presidência, por Marcos Vinícius (Pros) como relator e Edsom Sousa (MDB) como membro.

Atualmente, 84 famílias trabalham no Camelódromo. O mês de dezembro é considerado pela categoria como o mais lucrativo, pois é com o aumento das vendas no Natal que os ambulantes conseguem fazer seu “13º salário”.

 

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