Dor e Arte

João Carlos Ramos

A cana cumpre sua missão ao aceitar o desafio do moedor. Indubitavelmente, existe outra alternativa, senão enfrentar de frente o tormento assustador em prol da coletividade.

Os alimentos, de forma geral, são frutos do esforço contínuo dos lavradores e suas tecnologias, sempre inovadoras. Assim também a ARTE vem à luz através da criatividade e do esforço, desde a concepção até o nascimento. No livro clássico “A Necessidade da Arte” (Ernst  Fischer, 07/07/1899-31/07/1972), o autor nos mostra a realidade da vida e o papel determinante da arte para nos  iluminar o caminho.

O importante não é o peso da carga, mas a fortaleza dos ombros... O terno canto das aves e o suave sussurro das águas de um riacho nos anestesiam, enquanto a dor segue seu caminho, destruindo os mais fracos. Durante o regime militar (01/04/1964- 15/03/1985), surgiram as mais expressivas obras de arte brasileiras, no campo da literatura, música, teatro etc. Durante os referidos anos de chumbo, os artistas eram impedidos de expressarem seus sentimentos e consequentemente, perseguidos e(ou) aprisionados em sua maioria. A alma falava mais alto e o parto da arte era normal.

Pesquisando a história, podemos constatar que, após o regime, ou seja, desde o início da redemocratização a obra de arte se tornou estritamente profissional e a inspiração e simplicidade alçaram voo.

Surgiu também a mediocridade dos oportunistas, vendendo gato por lebre e proliferando o mercado artístico de cópias  e "não-arte". O povo não se deixa seduzir e alegrar por uma obra que não seja genuinamente artística e consequentemente a rebelião interior nos mostra um fogo pintado. A abominação no lugar santo foi quando a mesquita de Omar ocupou o lugar do santuário de Salomão.

Desde então, os judeus oram sem cessar para que Jeová envie um terremoto e destrua a mesquita, a fim de restabelecerem o culto original ao Deus de seus ancestrais.

Igualmente podemos constatar a abominação no lugar da arte real. Música que é tudo, menos música. Teatro que é tudo, menos teatro e, principalmente, a sagrada poesia sendo assaltada nas ruas do 

coração... O pior é que não há nada de novo no front. Nenhuma esperança no campo educacional, que obviamente traria frutos para a arte futura. O sistema educacional muito aquém das necessidades

e carências, principalmente da comunidade jovem, onde deveríamos depositar nossa confiança e apostar nossa sorte. Um sistema político negociável, que dificulta o avanço em todos os rumos nossa sociedade. Para piorar de vez a situação, vemos uma população sempre crescente em números, facilitando o império da miséria e dos diversos tipos de corrupção e mazelas mil.

A arte poderia, pelo menos, fazer de conta que está salvando, as exceções são raras e caminhamos para o caos.

Oxalá a dor da pandemia da covid-19, excluindo a farsa, possa brotar em nossa sociedade o verdadeiro sentimento da arte. Meditemos no poema “Esperança”, de Mário Quintana:

“Lá bem no alto do 12º andar do ano, vive uma louca, chamada esperança. E ela pensa, quando todas as sirenas, todas as buzinas, todos os reco-recos tocarem. Atira-se. E

— Ó delicioso voo! Ela será encontrada, miraculosamente, incólume na calçada, outra vez criança… E em torno dela indagará o povo: — Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?

E ela lhes dirá (é preciso dizer-lhes tudo de novo!). Ela lhes dirá bem devagarinho para que não esqueçam: — O meu nome é e-s-p-e-r-a-n-ç-a...

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