Do poder econômico e dos tributos

Sheila Salvino

De forma didática, podemos definir carga tributária como sendo a relação entre a receita tributária e a renda. Digressões sobre a carga tributária brasileira são bastante comuns entre os defensores de um Estado de atuação reduzida, bem como entre aqueles que, sem esmerar a lógica, endossam irrefletidamente o discurso liberal construído pelos detentores do poder econômico, apesar de reivindicarem benesses estatais progressivas. Todos os direitos demandam recursos públicos para serem minimamente garantidos. Logo, quanto mais se reivindica melhorias na educação, saúde, habitação e segurança, maior é a quantidade de recursos que o Estado precisa aportar nos referidos segmentos.

Ainda que a arrecadação tributária não seja a única fonte de recursos que sustenta a existência do Estado, ela é, certamente, a principal. Em países que se encontram em processo de desenvolvimento, cuja infraestrutura ainda está por ser construída, o impulso ao desenvolvimento depende muito da capacidade de investimento estatal. Por consequência, a carga tributária nestes países se apresenta mais robusta, se comparada com aquela observada nos países desenvolvidos. Apesar de a crítica comum se concentrar na análise de percentual geral, importa democratizar uma nova forma de analisar e pensar o sistema de tributação que possa oferecer ao cidadão médio elementos que possibilitem entender o que se processa em nosso país.

É fato incontroverso que o Brasil enfrenta sérios problemas no que se refere à adequada utilização dos recursos públicos. Embora este seja um ponto de discussão essencial no processo de construção de um país mais justo e eficiente, importa-nos, também, analisar a estrutura tributária brasileira para identificar o quanto a sua conformação é capaz de impactar na distribuição de renda em nosso país. A desigualdade e a pobreza não são produtos inevitáveis do império da meritocracia. Ao contrário, são condições que se configuram como produto de escolhas políticas que refletem a desigual distribuição de poder nas sociedades.

O sistema tributário brasileiro, em vez de promover aquilo que a Constituição Federal apregoa, reforça as desigualdades. O cenário que aqui se reproduz não possui similitude com aquele observado em boa parte dos países desenvolvidos. Nas nações em que o Estado é tido como um agente oportunizador da distribuição de renda, o próprio critério de tributação serve a este propósito.

 No Brasil, ao contrário, o sistema tributário é uma barreira estrutural para a redução de desigualdades internas. Apesar de nossa carga tributária bruta girar em torno de 35% do PIB, ela é marcadamente mal distribuída, de modo que os mais pobres e a classe média pagam muito mais impostos (proporcionalmente) do que pessoas com rendas muito altas.

É urgente que falemos mais sobre perda de progressividade, má distribuição da carga tributária entre impostos diretos e indiretos e baixa tributação do patrimônio.

 

Sheila Salvino – Advogada, especialista em direito tributário.

[email protected]

 

Comentários