Cinema Falado destaca filme "Um filho que caiu do céu"

Lançamentos da semana

*UM FILHO QUE CAIU DO CÉU (MOMO). FRANÇA. 2017. DIR: SÉBASTIEN THIERY. ELENCO: CHRISTIAN CLAVIER, CATHERINE FROT, SÉBASTIEN THIERY. COMÉDIA. 85 MIN.

Uma das melhores comédias dos últimos tempos, fato singular já que os franceses não são famosos exatamente por esse quesito, mas o grande trunfo dessa produção é a presença desses dois atores sensacionais, Christian Clavier e Catherine Frot, que dão um show de interpretação. Eles fazem o casal André (Clavier) e Laurence (Frot), que vive muito bem e tem um padrão de vida de classe média alta, e a vida vai muito bem até aparecer um dia na vida deles um homem surdo que alega ser filho deles, apesar deles não terem a mínima lembrança de tê-lo tido, e ainda traz consigo uma namorada grávida. Mesmo sabendo que estavam sendo enganados, esse fato mexe com o lado materno de Laurence que nunca conseguiu ter um filho, e de repente ela começa a desenvolver um instinto maternal em relação ao “filho”, o que vai deixar André apavorado, sem saber como lidar com a situação. O filme foi inspirado em uma peça teatral chamada “Momo” dirigida por Sébastien Thiery, o mesmo que também dirigiu o filme e atuou como o homem surdo, e vai agradar em cheio aquelas pessoas que gostam de um humor mais refinado, embora a gente ria só de ver a cara de Christian Clavier, que rouba a cena com suas expressões de desespero. Já Catherine Frot já tinha nos dado o prazer de vê-la em “Margueritte” onde interpreta uma rica mulher e cantora amadora que acha que tem uma grande voz e, para desespero de todos, começa a fazer apresentações desastrosas onde só ela se acha afinada. Dois craques franceses que vão trazer muita alegria durante a projeção desse filme.

*O TERCEIRO ASSASSINATO (SANDOME NO SATSUJIN). JAPÃO. 2017. DIR: HIROKAZU KORE-EDA. ELENCCO: MASAHARU FUKUYAMA, KÔJI YAKUSHO, SHINNOSUKE MITSUSHIMA. DRAMA. 124 MIN.

O diretor japonês Hirokazu Kore-eda já havia nos surpreendido com seu belo “Depois da Tempestade” e agora nos apresenta esse suspense onde as aparências sempre nos enganam, pois no começo do filme acompanhamos dois homens caminhando junto a um rio e um deles golpeia o outro com uma pedra e o mata, queimando o corpo depois. Logo no começo imaginamos o culpado que tem o nome de Misumi (Yakusho), que se entrega e confessa o crime, mas com o tempo as coisas vão embaralhando e cada versão que ele dá do ato nos leva para mais longe da verdade. Somos jogados então em um labirinto onde ficam mais perguntas que respostas, até mesmo para seu advogado, Shigemori (Fukuyama), e assim o diretor nos coloca a questionar sobre a própria imagem do cinema, pois sentimos que podemos estar sendo enganados por ele. Fascinante filme que desconstrói as narrativas e nos leva a questionar sobre a pena de morte e os julgamentos que fazemos.

Documentário

*MORRO DA CONCEIÇÃO. BRASIL. 2006. DIR: CRISTIANA GRUMBACH. ELENCO: ATORES DESCONHECIDOS. 87 MIN.

A diretora Cristiana Grumbach participou de vários documentários do mestre Eduardo Coutinho (que participa de um bate-papo nos extras) e aprendeu muito com ele essa arte para enfim desenvolver seu próprio estilo que sobressai bem nesse filme passado no antigo bairro do Morro da Conceição, um local povoado pela classe media baixa oriunda em grande parte dos primeiros portugueses que aqui chegaram ao começo do século vinte para trabalhar nos portos do Rio de Janeiro. A diretora escolheu entre os quatro mil moradores uma dezena deles para conversar sobre suas lembranças, o que acontecia lá quando eram ainda jovens, e o que emerge é um redemoinho de emoções que ficaram marcadas para sempre na alma deles, que hoje vêem o bairro se descaracterizar a olhos vistos. Essas gravações aconteceram no começo dos anos 2000 e de lá para cá não sabemos mais como está no presente, mas as festas que participaram, os eventos religiosos que lá ocorriam, os partos que eram feitos nas casas, tudo isso vai ficar nas nossas retinas para sempre. Uma cena que mais nos chama a atenção é de uma senhora de 94 anos, que no meio da entrevista cai em transe e sai do corpo literalmente, para voltar logo depois e revelar que estava pensando na mãe, um momento lindo onde a memória convive com o fotograma. Cristiana trabalha muito bem os silêncios e esses momentos são os que mais gritam dentro da gente por algo que um dia perdemos e que não sabemos o que é.

Música da semana

Enquanto escrevia essa coluna deixei rodando as gravações do mago trompetista Miles Davis com o arranjador Gil Evans. Música da semana: The Duke/Blues for Pablo.

Otávio Paiva
www.deltadvdvideo.com.br

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