Causas do desabamento do Cemitério da Paz ainda são desconhecidas

Paulo Vítor de Souza

Ainda não é possível apontar de quem é a responsabilidade pelo deslizamento de terra que soterrou túmulos no Cemitério da Paz, em 31 de janeiro deste ano. É o que comunicou o procurador-geral do Município, Wendel Souza, em coletiva de imprensa na manhã de ontem. Estiveram na reunião, além do procurador, os advogados Francis Vanine e Diego Ribeiro, representantes das famílias que tiveram túmulos afetados, o advogado Fernando Barcelos, representante da Gerais Arquitetura e Engenharia, construtora que realizava os serviços no terreno, além da representante da Associação das Famílias, Andréia Maciel.

Desdobramentos

Depois de acionar judicialmente a empresa, a Prefeitura teve a seu favor uma decisão do juiz Núbio de Oliveira, que designou um perito para analisar o estado do terreno e o apontar as possíveis causas do rompimento do muro. De acordo com a Prefeitura, a perícia foi concluída e o parecer já está anexado ao processo. A Administração, por meio do procurador Wendel Santos, disse que a prova produzida pela perícia pode vir a ser usada em alguma outra ação judicial, dependendo, segundo ele, de até onde a empresa, o proprietário do terreno e o Município trabalharem em conjunto. O procurador enfatizou ainda que, até o momento, não houve nenhum conflito entre as três partes envolvidas no caso.

— O resultado da perícia é muito extenso, e até para evitar que se entre no campo da contenda, nós vamos esperar que a construtora se pronuncie sobre o laudo, que visa futuros efeitos, não necessariamente litigiosos. As conclusões que lá foram feitas, eu não as tenho aqui, são muito técnicas e vamos deixar isso para um segundo momento. Vamos primeiro dar a oportunidade à construtora de se manifestar nos autos. Prudentemente, não vamos entrar em detalhes técnicos. (...) Muita coisa pode ser feita independentemente de se discutir culpa, inclusive a obra, do jeito que ela está, ela não pode continuar — disse o procurador, salientando que a perícia não faz nenhum tipo de julgamento de causa, trazendo apenas apontamentos técnicos.

Finalizada a perícia, a Prefeitura aguarda o pronunciamento da construtora nos autos para que o laudo seja discutido, o que deve acontecer nos próximos dias.

Wendel Santos explicou ainda que, pelo fato de nunca ter passado por alguma situação como esta, o Município ainda não tem uma expertise nesse sentido, mas que procurou tratar a questão de maneira interna em respeito aos familiares que foram afetados. Afirmou ainda que não quer esgotar as possibilidades de diálogo entre as partes e que, depois de apurada a responsabilidade técnica, pode haver ajuizamento por parte das famílias que tiveram túmulos afetados.

Partes no caso

O advogado da Serra Dourada Empreendimentos e Participações não compareceu. Já o defensor da Construtora Gerais disse ao Agora que trabalha em conjunto com a Prefeitura e com os familiares. Segundo Fernando Barcelos, não há limite para o diálogo.

— O limite é a boa vontade das partes, porque, na realidade, esse procedimento judicial que foi feito tem objetivo de evitar litígios posteriores. Quando se verifica através de uma perícia que a responsabilidade é imputada a determinada pessoa ou empresa, cabe a ela assumir a sua responsabilidade. Então, nós entendemos que o fato de o procedimento judicial ter sido instaurado não impede que nunca tenha litígios — explicou Barcelos.

O advogado ressalta que ainda é cedo para apontar responsabilidade, pois, segundo ele, há a possibilidade de uma combinação de fatores.

— Nós temos um entendimento com a Prefeitura e com os familiares de caminharmos juntos, porque quando acontece algum evento danoso, logo começa-se a identificar “foi fulano, foi beltrano, porque tem uma obra ali”. Não é só porque se tem uma obra que a responsabilidade necessariamente seja dela. Podem ter concorrido outras causas. Este procedimento que foi feito pelo Município foi uma vistoria, que tem o objetivo de registrar o estado da coisa hoje para que ela seja mexida — apontou.

Sobre a provável causa do acidente, o advogado declarou que pode ter havido outros fatores que influenciaram, entre eles, uma possível omissão por parte da Prefeitura, já apontada anteriormente por familiares e pela vereadora Janete Aparecida (PSD) que chegou a notificar a Administração sobre os riscos do local.

— Esta causa pode não ser necessariamente uma só, pode ser concorrente entre atitudes realizadas pela empresa e pela Prefeitura, ou falta de atitude, no caso, porque o cemitério já havia apresentando problemas anteriormente à obra — destacou.

Perguntado sobre o embargo que a construção havia sofrido horas antes do desabamento e qual o peso disso dentro do processo, Fernando Barcelos alegou que a obra foi paralisada uma semana antes do deslizamento e que ela foi impedida posterior ao problema. Ele também disse que há uma contradição dentro do processo referente a um documento apresentado pela Prefeitura, que segundo ele não confere.

— A obra sofreu embargo na realidade depois que o problema aconteceu, não foi antes. A construtora informou à Administração em todas as situações que identificou possíveis problemas anteriormente, e nós temos isso tudo documentado. Existe, ao que parece, uma confusão, que vamos esclarecer no processo com relação a um documento que foi apresentado datado de 2018, e que não poderia ter sido realizado naquele ano, porque os eventos que ele menciona não ocorreram no período — explicou.

Sobre a falta de projeto arquitetônico e licença de funcionamento, o advogado disse se tratar de outro equívoco. Segundo ele, ocorreu primeiramente um trabalho de adequação, realizado pela empresa de combustível Shell, uma vez que no local havia um posto, e que a construtora foi contratada para realizar etapas da obra.

— Depois que a empresa realizou o trabalho, a construtora entrou para fazer a fase preparatória do terreno, então havia alvará para escavamento do terreno? Havia. Depois disso, a construtora fez o que foi contratada para fazer e se retirou da obra. (...) Quando você sofre uma agressão e tem uma atitude precipitada em tentar colocar culpa em alguém, você acaba cometendo erros. Então, não se não deve colocar culpa precipitadamente em ninguém. Primeiro, a gente tem que identificar as causas do problema. O Município às vezes tem aquela obrigação de dar aquela resposta rápida, e nem sempre isso é o mais adequado — pontuou.

Sobre o andamento do processo, Fernando Barcelos disse que fará um posicionamento formal dentro do processo em relação a erros, que, segundo ele, foram cometidos e precisam ser corrigidos.

Famílias

As pessoas que tiveram túmulos de parentes afeados pelo deslizamento se organizaram em uma associação representativa. Dois advogados trabalham na interlocução com a Prefeitura. Ao Agora, o advogado Francis Vanine disse que, no momento, é imprescindível que os familiares informem os documentos dos parentes que estavam enterrados para auxiliar na catalogação.

— Nosso objetivo é que todas as certidões de óbito estejam conosco para que a gente possa buscar então o sepultamento provisório destes restos mortais e, depois, o sepultamento definitivo — disse.

Ainda não há a quantidade exata de quantos corpos estão sob a terra. Segundo a Administração, devido ao fato de o cemitério ser muito antigo, pode acontecer que algum túmulo não estivesse identificado, o que dificultaria a contagem precisa.

Francis Vanine falou também que a intenção da ação coletiva dos familiares é garantir a identificação e sepultamento definitivo dos restos mortais que foram atingidos pelo deslizamento.

Sobre o andamento do processo, revelou que ele ocorre com celeridade, atribuindo ao bom diálogo das partes e à sensibilidade do juiz do caso.

— A gente tem perspectiva que essa ação vai durar, no mais tardar, eu acredito que nos próximos 15 dias, com a consolidação da perícia. Esta ação tem como objetivo identificar o que aconteceu e os responsáveis — finalizou.

Desabamento

O muro do Cemitério da Paz desabou na noite de 31 de janeiro. Dezenas de jazigos foram soterrados pela lama que escorreu. O Corpo de Bombeiros realizou recentemente trabalhos de exumação em túmulos que corriam risco de desabamento. Os corpos retirados foram colocados em sepulturas provisórias. Os restos mortais que estão sob a lama, depois de terminado o processo judicial, terão de passar por exames de identificação.

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