Câmara e Unimed

Ernane Reis Gonçalves 

Eu precisava levar uns livros para o meu amigo João que trabalha na Secretaria Geral da Câmara Municipal de Divinópolis.

Chegando lá, perguntei por ele e o recepcionista informou onde era a Secretaria Geral.

Na entrada há uma antessala. Parei à porta, esperando o que julgava ser um atendimento, pois um rapaz estava frente ao computador e o outro em pé, defronte à mesa.

Saiu uma funcionária jovem com uma pasta e aparentemente nem me viu à porta.

Os rapazes continuavam conversando baixo, e o que estava de pé sentou-se na beira da mesa e aí notei que ele também era funcionário, pois havia outra mesa, com outro computador. Estavam, pois, batendo um papo animado. Afinal, ninguém é de ferro.

Eu ali, à porta, como um espantalho, aliás, um fantasma, pois a menos de dois metros de mim, eles não me viam, não me percebiam, não me pressentiam. 

Eu não existia.

Pensei em ficar ali, quietinho, indeterminadamente, e, se não estivesse com muita pressa para entregar os livros ao João, eu juro que ficaria ali, a ver quanto tempo resistiria a minha invisibilidade.

Mas, como não podia esperar muito, depois de quase cinco minutos, bati à porta.

Eles me ouviram e me viram.

— Boa tarde — eu disse — Eu preciso falar com o João.

— Ah, é ali — um deles indicou.

— Ô, Ernane, vem cá! — chamou-me o João, que, na sala atrás da divisória, reconhecera a minha voz.

Agradeci aos moços e entrei.

Conversamos, deixei os livros e ainda comentei com o meu amigo o fato de não ter sido notado pelos moços. 

Ele meneou a cabeça, lamentando consternado. Não falou nada sobre os moços. Com certeza não devia – ou não podia – falar nada nesse sentido. 

Claro que, a Casa sendo pública, entra e sai quem quer e como quer. Provavelmente, ninguém ali precisa se anunciar nem ser anunciado. Eu é que estava fora do contexto.

Saí meio desiludido. É assim que somos tratados pelos funcionários públicos? Mas eu já fui funcionário público e nunca tratei ninguém assim.

Ao sair, quis beber água e encontrei um bebedouro. Não bebi água porque um cadeirante estava enchendo várias garrafinhas com o precioso líquido.

Notei um aviso. “Não fornecemos copos”

Claro. Imagina se a Câmara for gastar a verba de que dispõe dando copos ao povo. Não vai sobrar dinheiro para as grandes obras do Legislativo, nem para pagar os   funcionários que nem veem as pessoas que procuram aquela Casa.

E, como eu tinha de ir pela segunda vez à agência da Unimed para autorizar um procedimento médico, não esperei para beber água.

Da primeira vez que usei a Unimed, pedi a autorização na minha terra, Carmo do Cajuru, e no dia seguinte a busquei em Divinópolis. Carmo do Cajuru mandou o pedido com presteza e com presteza a sede, em Divinópolis, autorizou.

Eu saíra da Câmara onde me senti diminuído e entrei na Unimed. Mostrei o pedido, peguei uma senha e, mal me sentei, fui chamado ao guichê nove, onde uma moça gentil recebeu-me com um sorriso doce como o quê.

Rapidinho a autorização foi impressa. Não me contive e agradeci a rapidez do atendimento e a fineza da Daniele, a moça de sorriso doce do guichê nove.

Saí aliviado e, como estava com sede, procurei o bebedouro e bebi água.

Havia copos.

A Unimed é uma entidade particular. A Câmara é pública. É um estigma?




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