Após pressão, Cleitinho volta atrás em voto e pede governador para vetar

Deputado foi orientado por políticos e apoiadores a mudar de ideia após ser favorável a projeto

Bruno Bueno

Ninguém falou de outro assunto envolvendo a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em Divinópolis nesta semana, a não ser do voto de Cleitinho Azevedo (CDN). O voto favorável do deputado ao projeto de lei Nº 2.316/2020, que altera a Lei nº 14.170, de 15 de janeiro de 2002, que determina punições a empresas que discriminem pessoas em virtude de de sua orientação sexual, identidade ou expressão de gênero, gerou bastante repercussão nas redes sociais, colocando em risco a imensa popularidade do político.

Membros da ala conservadora da cidade criticaram o posicionamento do deputado, afirmando que o projeto abre brecha para a “ideologia de gênero” em Minas Gerais. Após a divulgação de uma imagem com seu rosto e a frase “Deputado Cleitinho vota a favor de projeto que libera a ideologia de gênero em Minas Gerais”, o político primeiramente negou a informação, dizendo que o projeto dispõe sobre a discriminação. No entanto, durante pronunciamento na ALMG, ocorrido na última terça-feira, 14, ele voltou atrás e pediu desculpas pelo voto favorável.

Influência?

No entanto, muitas pessoas especulam nos bastidores políticos que a mudança de posicionamento do deputado ocorreu por conta de influência do vereador Eduardo Azevedo (PSC), irmão do político e militante contrário à identidade de gênero. 

O Agora entrou em contato com o vereador para questionar sobre a mudança de posicionamento repentina do deputado. Eduardo, por meio de sua assessoria, declarou que Cleitinho recebeu orientações de seu irmão e colegas parlamentares. Ele confirma ter conversado com o político após a aprovação do projeto, mas diz não saber o que influenciou a mudança de opinião.

— A mudança de posição de Cleitinho teve influência de outros deputados e de um grande número de pessoas que se manifestaram alertando-o. Cleitinho entendeu que a proposta era diferente do que havia pensado. O vereador Eduardo conversou com o irmão após a aprovação na Assembleia Legislativa, manifestando que entendia o projeto de outro modo e reconhecia nele questões perigosas ligadas à ideologia de gênero. Eduardo sempre deixou claro sua posição contrária — afirma.

Chorou

Durante seu pronunciamento na última reunião da Câmara de Divinópolis, Eduardo Azevedo disse que seu irmão chorou de arrependimento por ter votado a favor do projeto. Ele também declarou que a decisão equivocada foi causada por “má assessoria”.

— Eu conversei muito com ele no final de semana (...). Admiro sua humildade e a postura de não fazer politicagem. Ele chorou pelo arrependimento da forma que ele votou. Ele foi muito mal assessorado. Nós sabemos que a assessoria é tudo. A pauta do meu irmão é fiscalização, ele não entrou muito no tema ideológico — explicou.

Por fim, Eduardo voltou a falar mal do projeto e disse que a proposta era tendenciosa. O edil também reforçou que é contra qualquer pauta sobre identidade de gênero.

— Poderia vir alguma coisa da turma revolucionária que prega a destruição dos valores familiares? Não. Todo projeto que vem do PT tem que acender a luz vermelha para eles. O projeto é tendencioso e, infelizmente, por má assessoria, o meu irmão votou a favor. Eu também sou contra o projeto! — destacou.

Perdão

Pouco antes, durante reunião da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), Cleitinho pediu desculpas aos mineiros e reforçou seu posicionamento contrário à “ideologia de gênero”. Além disso, reiterou que não é preconceituoso.

— Eu quero pedir perdão para toda a população mineira. É um assunto que eu não domino. Estou sendo crucificado por conta de um projeto que foi votado 15 dias atrás. Eu sou contra a ideologia de gênero, mas não sou contra as pessoas. Eu sou a favor que a gente respeite o próximo. A gente não tem que mexer na pureza das crianças. Eu não sou homofóbico e preconceituoso — enfatizou.

Na continuidade de seu pronunciamento, Cleitinho pediu que o governador Romeu Zema (Novo) vete o projeto. 

— Quero pedir humildemente ao governador que vete o projeto para que a gente possa consertar. Errar uma vez é humano, mas persistir no erro é burrice. Eu não falei com a intenção de falhar. Tanto que eu estou aqui em cima pedindo para vetar. (...) Estou pedindo perdão pelo meu voto. A gente vai resolver isso — finalizou.

O Agora entrou em contato com o deputado para perguntar se os posicionamentos do seu irmão, Eduardo Azevedo (PSC), influenciaram em sua mudança de opinião sobre o projeto. Até o fechamento desta edição, por volta das 17h30 de ontem, a reportagem não obteve resposta.

Críticas

O pronunciamento de Cleitinho, publicado em suas redes sociais, não foi suficiente para interromper as críticas direcionadas ao parlamentar.

— Uai, deputado. No seu pronunciamento, antes da votação, o deputado Bruno Engler explicou detalhadamente todos os riscos e todas as brechas que o projeto iria abrir. Que bom que o senhor reconheceu seu erro em apoiar essa insanidade, no entanto o projeto já passou! — disse uma internauta. 

Outra pessoa comentou que, se o governador não vetar o projeto, a carreira política de Cleitinho estará manchada.

— Cleitinho, tenho maior respeito por você e pelo seu trabalho, mas nessa você pisou na bola. Agora não é arrepender, mas tentar fazer com que o Zema rejeite o projeto. Se não vai sujar sua carreira política — ressaltou.

Projeto

O conteúdo do projeto diz que empresas serão punidas se discriminarem pessoas por sua orientação sexual, identidade ou expressão de gênero.

— O Poder Executivo imporá, no limite da sua competência, sanção à pessoa jurídica que, por ato de seu proprietário, dirigente, preposto ou empregado, no efetivo exercício da atividade profissional, discrimine ou coaja pessoa, ou atente contra os seus direitos, em razão de sua orientação sexual, identidade ou expressão de gênero — diz a pauta.

A multa para a prática varia de R$ 3.352,40 a R$ 177.480,00, dependendo da gravidade da ocorrência. Ainda segundo o projeto, a denúncia de discriminação pode partir da própria pessoa ofendida, de entidades de proteção de direitos humanos e de promoção da cidadania LGBT, órgãos de controle e participação social, programas e serviços de recebimento de denúncias ou de terceiros interessados.

Justificativa

O deputado estadual André Quintão (PT), em sua justificativa de projeto, afirmou que a alteração da lei busca continuar com as políticas públicas de combate à discriminação de pessoas LGBTQIA+.

— A proposição soma-se, a nosso ver, às várias iniciativas adotadas por este Parlamento na defesa dos direitos e garantias fundamentais, constitucionalmente preconizados. Nesse sentido, temos como imprescindíveis a construção e o aperfeiçoamento das políticas públicas de inclusão social e de combate à discriminação e a quaisquer outras formas de violência, que atingem, em particular, a população LGBT — defende.

 

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