A honestidade

A honestidade - Ômar Souki

Quando eu tinha 10 anos, encontrei na porta do Divinópolis Clube uma carteira cheia de dinheiro. Era uma tarde de Carnaval e eu estava me dirigindo ao clube, que fica na rua São Paulo, para me divertir com meus amigos e amigas. “Nossa! Quantos bombons e sorvetes poderia comprar com todo aquele dinheiro”, foi o meu primeiro pensamento. Mas, não, logo retirei aquilo de minha mente, peguei a carteira e fui até a diretoria do clube, onde a entreguei. Eu supus que a pessoa que a havia perdido iria até lá perguntar se alguém a tinha encontrado. Dali, fui até ao salão onde as crianças se divertiam ao som da alegria.

Eu estava distraído brincando e pulando, quando ouço o meu nome no alto-falante. Uma voz masculina solicitava a minha presença na diretoria. “Será o que foi que fiz de errado, para ser chamado pelo alto-falante?”, pensei.  Com medo, dirigi-me até lá, onde vi que lá estavam – dentre outras pessoas – meu pai, ao lado do Rosenwald Hudson, presidente do clube. Fiquei mais receoso ainda: “Deve ter sido algo bem grave, pois até chamaram o meu pai!”. Mas logo que o presidente começou a falar, eu respirei aliviado: “Ômar! Chamamos você até aqui para dar-lhe os parabéns na frente de seu pai. A carteira que você encontrou – cheia de dinheiro – é o salário semanal deste pedreiro. Se você não a tivesse entregado, ele e a sua família iriam passar dificuldades!”.

Lorena Lafraia, em seu artigo “Honestidade, a virtude do amor à verdade”, cita François de La Rochefoucauld: “essa virtude é uma abertura de coração que nos mostra tais como somos; é um amor à verdade, uma repugnância a se disfarçar, um desejo de reparar nossos defeitos e até de diminuí-los, pelo mérito de confessá-los”. Esse amor à verdade é o que nos impulsiona a devolver o excesso de troco no supermercado e agir com as outras pessoas como gostaríamos que agissem conosco.

Ser honesto é falar a verdade e cuidar das coisas alheias com esmero. Isso acontece quando zelamos pelo quarto de hotel que estamos usando ou pelo imóvel alugado que um dia teremos de devolver. Pensar, sentir e agir com honestidade amplia os nossos horizontes pessoais e profissionais.   

Mas, ao agirmos com desonestidade, apagamos o nosso viver. A vida perde o brilho. Rubens Sakay, no artigo “A virtude da honestidade”, afirma: “A desonestidade limita os nossos caminhos, enquanto a honestidade nos dá a liberdade de escolher, caminhar, empreender. 

Meu pai estava coberto de razão quando me dizia: “Se o malandro soubesse como é bom ser honesto, ele seria honesto por malandragem!”. Mas parece que grande parte dos políticos, no Brasil e no exterior, não entende a lógica da honestidade – do amor à verdade. A nossa pátria tem sofrido com a corrupção de políticos durante décadas. Calcula-se que o assalto aos cofres públicos atinja a casa dos trilhões de reais. Se esse dinheiro tivesse sido empregado em obras destinadas à saúde, à educação, à ciência e a tecnologia, enormes sofrimentos teriam sido evitados e o país já estaria dentre as nações do mundo desenvolvido.

A honestidade é algo tão importante que, se eu não tivesse, naquela longínqua tarde de Carnaval, devolvido a carteira do pedreiro, não seria hoje quem eu sou. Ainda estaria amargando o sabor de bombons e sorvetes desfrutados à custa do sofrimento alheio. Porém foi em grande estilo que em minha mente e em meu coração se esculpiu o valor da honestidade. Até hoje, seis décadas depois, eu ainda me emociono só de pensar naquele magnífico evento, durante um Carnaval, que talvez tenha sido o melhor de toda a minha vida. Quanta alegria me trouxe aquele gesto de honestidade – de amor ao próximo!  

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