A invenção do Branco
Domingos Sávio Calixto
A América do Norte foi invadida por colonizadores em 1498, assim como o Brasil também foi invadido em 1500, já que ambos possuíam uma civilização originária nativa.
O atual estado de Virgínia, nos EUA, está para os americanos assim como a Bahia está para o Brasil, notadamente em termos de primazia de ocupação e recebimento de população afrodescendente. Virgínia foi o primeiro território dos EUA a ser colonizado pelos britânicos e a cidade de Jamestown o primeiro assentamento inglês das Américas (1607).
Naquela época, homens negros virginianos podiam garantir sua liberdade de servidão contratada, podiam adquirir terras como membros respeitados da comunidade e até mesmo invocar o sistema jurídico da colônia para discutir direitos.
Ocorre que ‒ por volta de 1676 ‒ uma discordância entre proprietários de terras e o governador da Virgínia começou a interferir no cenário político-social vigente. Os proprietários queriam avançar e invadir ainda mais as terras indígenas, tomando-as e exterminando os nativos.
Por outro lado, o governador de Virgínia acatava as determinações da coroa inglesa no sentido de evitar conflitos com os nativos originários. O governador da Virgínia era William Berkeley, e os proprietários fazendeiros liderados por um indivíduo chamado Nathaniel Bacon.
Bacon desrespeitou a coroa inglesa e montou uma milícia envolvendo os servos de contrato nas terras, negros libertos e negros escravizados, e não só fez o ataque às tribos como também ateou fogo em Jamestown, como atitude de intimidação, deixando apavorados os habitantes locais.
A rebelião foi contida pela coroa, Bacon morreu de febre logo depois e os demais líderes foram enforcados, quase trinta. Entretanto, o evento gerou outras consequências.
A elite dos plantadores ficou tão aterrorizada com os resultados daquela força miliciana envolvendo servos, negros e os demais servos contratados que começou a separá-los inicialmente por religiosidade, depois por direitos.
Surge então a figura do “branco” cristão, que também passa a ter mais direitos do que os negros libertos ou escravizados. Os “brancos”, ainda que de classe social inferior, passam a ter mais direitos que os negros e essa medida provocou uma impossibilidade nova união interracial. Aos brancos são concedidas possibilidades jurídicas que são negadas aos negros, somente por serem “brancos”, mesmo que pendentes e devedores tanto quanto os negros.
Até então não se falava em “brancos”, mas em ingleses, escoceses, holandeses. A figura do homem branco passa ser uma instituição prevista no ordenamento jurídico de Virgínia.
Isso possibilitou um aumento considerável de escravos vindo da África e a legislação considerou permanente e perpétua a escravização dos virginianos de descendência africana.
Mediante tais leis, a elite de Virgínia fez com os brancos mais pobres – mas reconhecidos europeus – se afastassem cada vez mais dos negros e seus afrodescendentes.
É bom lembrar que o estado de Virgínia é conhecido por ser a “mãe dos presidentes”, como George Washington e Thomas Jefferson. Todos lutaram pela liberdade americana. Todos fazendeiros, donos de escravos.
A ideia de raça só viria mais de cem anos depois.